ECOLOGIA HUMANA
O pressuposto da
Ética na preservação do Meio Ambiente
Breve história
sobre origens e conceitos do Movimento Ambientalista
A terra está de
luto e todos os seus habitantes perecem.
Os animais selvagens, as aves do
céu e até mesmo
os peixes do mar
desaparecem
(OSÉIAS 4,3)
Resumo
Antigos documentos revelam que a
preocupação com a ecologia não é fato recente. Há referências até mesmo no
antigo Testamento. Há intervenções sublimes de Santo Agostinho, Francisco de
Assis, Erasmo de Roterdam. Mais recentemente, no séc. XIX, debate-se a
"ecologia profunda", através de Teilhard de Chardin e, depois, com
Aldo Leopoldo (1940), Arne Naess (1970) etc. Em nossos dias, o debate sobre a
vida, a sustentabilidade, está permanentemente visível na mídia, nas reuniões
da ONU etc. Este artigo pretende indagar sobre o papel da Ética como recurso
fundamental nesta discussão, concebendo Ética como algo que
vai além da mera abordagem
estética tão cara à vida moderna.
Palavras - Chave: Ecologia -
Preservação- Vida - Ética - Estética - Jornalismo
Abstract
Ancient documents reveal that the
concern with Ecology isn’t a recent fact. There are references about it even in
the Old Testament. There are sublime interventions from Saint Augustine, Saint
Francis of Assisi and Erasmus of Rotterdam. More recently, in the 19th century, people
have discussed “Deep Ecology”, based on the work of Teilhard de Chardin and,
later, of Aldo Leopoldo (1940), Arne Naess (1970), etc. Nowadays, the debate
about life and sustainability is permanently visible in the media, in United
Nations’ gatherings, etc. This article intends to question the role of ethics
as a fundamental resource in this discussion, conceiving ethics as something
that goes beyond the mere aesthetic approach, so costly to modern life.
Keywords: Ecology –
Preservation – Life – Ethics – Aesthetics – Journalism
1. Antecedentes
Apesar da proximidade histórica,
ainda presente na mídia e na trajetória do movimento ambientalista
internacional, o problema do relacionamento homem-natureza não pode ser datado
a partir da fermentação político-cultural que culminou com a revolta dos
estudantes em Paris em 1968 (ano em que a ONU realizou, também em Paris, a
Conferência da Biosfera) e com o fim da guerra do Vietnã em 1975. Também não se
pode fixar como marco inicial a primeira conferência da ONU para o meio
ambiente realizada em Estocolmo em 1972. Certamente, se buscamos uma visão
crítica do processo de desenvolvimento que
conduziu o mundo à situação
caótica de nossos tempos, devemos indagar sobre as razões de tamanho
desatino, sobre as causas que originaram esse status quo. Com
efeito, foi a Revolução Industrial, que marcou a transição entre a sociedade
agrícola-artesanal do Séc. XVIII para a sociedade urbano-industrial, que alterou
profundamente as relações de produção, exatamente entre 1750 e 1830. Isto se
tornou possível a partir da mais radical manifestação contra o feudalismo que
foi a Revolução Francesa, de 1789/1794. Com os grandes descobrimentos e, em
função deles, a formação do mercado mundial, teve início o maior processo de
globalização da história recente. A burguesia nascente apoiou inicialmente o
desenvolvimento das artes, favorecendo a pesquisa e as invenções do Século das
Luzes (Séc. XVIII) quando o poder da Razão se instalou nas ciências
(Racionalismo) e todo o conhecimento passou a ter uma finalidade prática,
voltado para o admirável mundo novo que então surgia, com promessa de vida nova
para todos os que aderissem e apoiassem as teses do capitalismo.
Mas, como num conto de fadas com
sinal trocado, as oportunidades que surgiram com o novo sistema não eram para
todos. Pelo contrário, o que era de todos ou estava à disposição de todos –
como a água, a energia, as florestas, as praias, os recantos naturais, a terra,
os rios e mares, afinal, a natureza – passou a ter dono. Agora a água gera
energia e ambas são comercializadas. A terra ampla que poderia matar a fome de
tantos, está improdutiva no latifúndio. As praias estão cercadas por
condomínios de luxo ou por hotéis 5 estrelas. As florestas e o cerrado dão
lugar à monocultura da soja ou à pecuária...a concentração da renda, a acumulação do capital vão gerando a injustiça
que resulta na fome, na miséria, na violência, no desemprego, na infelicidade.
O estudo de antigos textos, entretanto, pode nos levar a recuar ainda mais no
tempo e no espaço em busca da preocupação do homem com a natureza.1 Já nos tempos
bíblicos, por exemplo, a preocupação com o domínio da terra e com a arte de
cuidar dos rebanhos é causa de guerras encarniçadas. Talvez por ler a Sagrada
Escritura ao pé da letra, adaptando-a aos seus interesses imediatos, é que o
homem passou a destruir aquilo que devia preservar. No Livro das Origens, o
Gênesis, não está escrito em nenhum lugar que o homem deveria destruir a terra
e apropriar-se dela com esperteza. Pelo contrário. Está escrito:
“Façamos o homem
à nossa imagem e semelhança. Que ele reine sobre os peixes do mar, sobre as
aves dos céus, sobre os animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todos
os répteis que se arrastam sobre a terra”. (Gen. 1,26). Logo em seguida,
disse Deus ao homem: “Frutificai e multiplicai-vos, enchei a terra e
submetei-a. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos
os animais que se arrastam sobre a terra...eis que vos dou toda a erva que dá
semente sobre a terra, e todas as árvores frutíferas que contêm em si mesmas a
sua semente, para que vos sirvam de alimento” (Gen.1, 28-29).
Os termos imperativos “reinar”,
“submeter” e “dominar” – aqui grifados – devem ser relacionados com as
categorias “doar” e “alimento”. A criação é uma dádiva para o alimento do
homem, isto é, para a sua felicidade. Como bem lembra Leonardo Boff,2 em nenhum
momento Deus “vendeu” a terra, nem passou escritura para uns em detrimento de
outros. A criação é para todos os homens, para que, usando-a com bom senso,
possam crescer e se multiplicar.
No entanto, a história do Antigo
Testamento é uma história de guerras e de lutas pela conquista da terra. Já no
cap. 6 do Gênesis, vendo a ganância e a maldade dos homens, Deus se arrepende:
“Exterminarei da superfície da terra o homem que criei, e com ele os animais,
os répteis e as aves dos céus, porque eu me arrependo de os haver criado”.
(Gen. 6- 7). Noé, entretanto, encontrou graça aos olhos do Senhor.
Percebemos que a centralização da
história humana nos interesses do próprio homem - escolha que lhe foi possível
pelo livre-arbítrio – gerou uma distorção no mandamento inicial da preservação
para a vida. O que era dádiva, o homem transformou em propriedade. Excluiu o
que não servia aos seus propósitos imediatos, tanto outros homens, como os bens
naturais. Feriu, matou, destruiu, transformou amor em ódio. A figura do dilúvio
poderia ser vista como uma necessidade de reequilíbrio do sistema, uma tentativa
de zerar tudo para começar outra vez. Apesar de todo o mal, há sempre um
princípio de bondadesuprema – ou cósmica, como preferem os agnósticos -
oferecendo à vida terrestre uma nova chance. Isto já ocorreu outras vezes, como
nas Eras Glaciais entre os períodos pré-cambriano e paleozóico em que grande
parte da superfície da terra cobriu-se de espessa camada de gelo.3
O homem, que surgiu no
Pleistoceno, como ancestral do atual homo sapiens, sobreviveu, a duras
penas, às glaciações do período, mesmo sem compreender esse fenômeno de
reciclagem da terra. Ainda hoje, com tanta informação disponível, as pessoas
descrêem dos cientistas ambientais, como na época de Noé, ignorando os que
manifestam preocupação com o futuro da humanidade diante de tanto descaso com a
natureza.
Mas os períodos glaciais são uma
realidade e eles não ocorrem por acaso, ainda que não estejam bem explicadas as
várias teorias sobre a ocorrência do fenômeno. Para alguns estudiosos, as
glaciações resultam de variações na irradiação de energia solar sobre a Terra.
Outros a atribuem a deslocamentos
do eixo terrestre. Para outros é a deriva dos continentes, movidos pelas placas
tectônicas, que provoca as alterações climáticas. Uma quarta teoria dá conta
que o pó vulcânico em suspensão na atmosfera reduz a quantidade de calor solar
sobre a superfície do planeta.
Com muita razão podemos temer que
o homem não tenha tanta sorte como em períodos glaciais anteriores, se
considerarmos a somatória de fatores que parecem confluir, paulatinamente mas
em progressão continuada, para o novo ciclo de ajuste do ecossistema mundial.
Não podemos esquecer que foi a quantidade de gás carbônico presente na
atmosfera que levou à última glaciação. Hoje, o efeito estufa é preocupação
universal e todos os governos se mobilizam para atender à Convenção do Clima
assinada por dezenas de países representados na Rio Eco-92, sob os auspícios da
ONU, depois consubstanciada no Protocolo de Kyoto. Mas só há pouco a Rússia
aderiu ao Protocolo, enquanto nos EUA, dez Estados invocaram o Pacto Federativo
pelo direito de aderir à luta a favor do clima, contrariando o governo Bush que
reluta em reduzir os níveis de lançamento de CO2 na atmosfera alegando que isto
implicaria em prejuízos para a economia americana.
Com a instantaneidade da notícia
em tempo real, que é uma característica da sociedade da informação, tomamos
conhecimento de todas as catástrofes ambientais no instante mesmo em que elas
estão ocorrendo. Embora de modo insuficiente, a cobertura da mídia chega acompanhada
de explicações das ciências sobre as origens dos fenômenos. Assim foi no caso
da movimentação das placas que provocou o maremoto na Ásia matando mais de 300
mil pessoas em dezembro de 2004. A força do impacto levou a conjecturas sobre o
deslocamento do eixo da Terra.
Muitos vêem nos verões europeus cada vez mais quentes, nos invernos tropicais
com dias de verão, em furacões como o Katrina que destruiu Nova Orleans e
arrasou Estados inteiros no sul dos EUA em agosto de 2005, ou nos efeitos do
fenômeno El Niño, com tantos desastres e inundações, uma manifestação clara de
que algo muito grave está acontecendo com o clima. Por isto, estudar o passado,
compreender o equívoco humano de centrar sua razão de ser apenas na acumulação
de bens, gerando exclusão e miséria, é fundamental se queremos educar e
conscientizar as pessoas na direção de um novo comportamento ambiental, de um
novo modo de vida, mais solidário, mais assentado no “ser”, no respeito às diferenças, na aceitação e na
tolerância. A Terra não é uma propriedade particular de alguns.4 Ela não existe
em função do homem. Ela existia antes e tem meios de se auto regular para
assegurar sua continuidade. É o homem que deve se adaptar à Natureza e não o
contrário.5
Se
não compreender isto, o homem será “dispensado” pelo sistema em sua monumental
e indomável marcha configurada na expansão cósmica entrevista por Einstein.
Outra abordagem histórica que
podemos analisar para compreender a questão ambiental pode tomar como base os
interesses da geopolítica humana. Do mesmo modo que assistimos hoje ao
desinteresse da maior potência nas questões ambientais - já que só a hegemonia
militar lhe interessa – também vimos no período das grandes descobertas como a preocupação
única era incorporar novas terras com suas jazidas, florestas e povos. A lei do
canhão interpretou ao pé da letra o princípio da dominação e a própria cruz do
Crucificado -
símbolo de perd o, aceitação e
paz – foi usada a serviço do poder temporal para reduzir e desbaratar culturas
autóctones em sua riqueza de variedade e diversidade.
A violência da dominação
colonialista6
desconfigurou
o equilíbrio sistêmico entre o índio e a natureza e entre as tribos. A chegada
do branco não destruiu apenas a natureza, também destruiu o elemento humano que
estava enraizado nela. A política de “gastar gente”, como na expressão de Darcy
Ribeiro para se referir à utilização de mão-de-obra escrava, não gerou o mundo
novo e justo imaginado pelo Iluminismo. Gerou o genocídio racial imposto a toda
a América Latina que ainda hoje geme sob os efeitos da voracidade colonizadora
com seus índios morrendo à míngua em reduzidas áreas (inclusive no Brasil); com
seus elevados níveis de mortalidade infantil; com a humilhação da mulher que se
prostitui para alimentar os
filhos; com o desesperante
desemprego ou sub-salário; com a violência patrocinada pelo tráfico de drogas;
com a injustiça social que reúne em um só ecossistema urbano o luxo, a miséria
e o lixo, com as correntes migratórias incessantemente procurando, esperançosas,
o prometido eldorado; principalmente com a corrupção crônica que corrói as
entranhas do poder e os políticos, para vergonha do país.
Todavia, se do Velho Continente
saiu a Parca em seu passeio global, nos séculos XV e XVI, para semear a morte
entre outros povos e outras terras – ainda que tudo isto tenha sido decantado
em verso e prosa de magistral valor artístico7, mesmo quando a arrogante nobreza
(como é próprio das elites arrogantes, em qualquer lugar) votou ao seu Poeta
Maior o mesmo desprezo com que tratou as culturas de além mar8 – também da
Europa vieram os primeiros exemplos de preocupação com a natureza. Antigos
documentos relatam fatos e histórias de vida que se impõem com expressiva e
gritante atualidade, 500 ou 800 anos
depois.
Há um caso emblemático na Idade
Média:9
Em
muitas ocasiões, quando quer significar o grito dos excluídos contra a exploração
e a miséria, o teólogo Leonardo Boff cita o exemplo de um jovem da Idade Média
que ouso romper os paradigmas do seu tempo, contestando
o feudalismo e projetando-se no futuro a partir de um ideal de vida simples e
coerente que logo contagiou a juventude e conquistou grande número de
seguidores.
Ele fala de Francisco de Assis
(1182-1226), o fundador da Ordem Franciscana, que não quis ser sacerdote,
preferiu ser apenas diácono para ter possibilidade e liberdade para pregar, uma
vez que a pregação era proibida aos leigos, como lembra a Crônica de Frei
Jordão de Jano.10
Filho do comerciante Pietro di
Bernardoni, da cidade italiana de Assis, até os vinte anos Francisco era um
jovem como todos os do seu tempo. Estudava aplicadamente, trajava-se com ricas
vestes, freqüentava festas, saia com os amigos (como nas "baladas" de
hoje), participava das guerras regionais, ia às missas e ouvia os sermões. Mas,
em 1206, após uma doença que lhe provocou febre intensa e inexplicável, durante
alguns dias, sentiu-se tocado para uma nova vida. Devolveu ao pai – diante do
bispo de Assis – até mesmo a roupa
do corpo, anunciando que iria
viver com os pobres e os leprosos, porque sentia que só assim estaria imitando
verdadeiramente a vida de Cristo. O episódio causou estranheza e escândalo.
Mas, vivendo como eremita fora
dos muros da cidade, já em 1208 Francisco contava com um grupo de amigos
igualmente dispostos a viver na pobreza. Em 1210 a regra franciscana foi aprovada
pelo Papa Inocêncio III e os frades iniciaram a empresa missionária na Itália, valorizando
o exemplo de vida e a penitência como argumentos de transformação. Em 1212, junto
com Santa Clara, Francisco fundou a Ordem das Clarissas. Em 1221 fundou a Ordem
Terceira Franciscana que até hoje congrega leigos casados em uma fraternidade
universal.
Seu profundo amor à natureza –
que via como manifestação de Deus aos homens – levou-o à criação do texto que é
considerado uma das primeiras manifestações literárias em língua italiana, o Cântico
ao Irmão Sol. Canonizado em 1228, é considerado o Patrono da Itália, juntamente
com Santa Catarina de Siena. Foi o criador do Presépio de Natal. É celebrado a
4 de outubro.
Francisco de Assis obedecia às
normas da Igreja, mas encontrou formas diferentes de pregar o Evangelho,
consagrando o princípio latino, segundo o qual verba movent, exempla trahunt
(as palavras comovem, os exemplos arrastam).
Para compreender melhor o grito
ecológico que é o Cântico ao Irmão Sol, é aconselhável traçar o contexto
em que Francisco o escreveu. Entre os séc. XI e XIII – entre as tantas
manifestações místicas do período medieval – proliferou na Europa uma seita
herege conhecida como seita dos cátaros que professavam uma forma
maniqueísta de cristianismo.
Acreditavam que as belezas da
natureza eram uma manifestação diabólica para desviar os homens do caminho do
Bem. Entendiam que os moribundos deviam ter seu sofrimento abreviado, por isto
os sufocavam com almofadas, motivo pelo qual seus seguidores também eram
identificados como “abafadores”.
Francisco opõe a essa visão
pessimista, um hino de louvor às criaturas: Quero cantar louvores ao Senhor por suas
criaturas / louvado sejas, meu Senhor, por todas as tuas criaturas / que no céu
formaste / por nossa irmã e mãe Terra...pela irmã água, a qual é muito útil e preciosa
e casta / louvai e bendizei a meu Senhor e rendei-lhe graças / por nossa irmã e
mãe Terra, que
nos alimenta e governa e produz
variados frutos e coloridas flores e ervas / louvado sejas, meu Senhor, pelo
Irmão Sol / pela irmã Lua e as estrelas / louvado sejas, meu Senhor, por todas
as tuas criaturas / louvado sejas, meu Senhor, por todos aqueles que perdoam
pelo teu amor.
(
STRABELI, 1993., p. 19 ).
O cântico expressa mais uma
experiência íntima, espiritual, do que uma cosmologia. É a experiência da
fraternidade entre os homens e os elementos cósmicos. É a experiência da
reconciliação do homem consigo mesmo e sua abertura ao ser que é pleno.
O hino canta a comunhão com a natureza, portanto é um hino de louvor. São
Francisco não fica nas coisas da natureza, mas, por elas, alcança o Criador (STRABELI 1993,
p. 115). 11
O sentido é que para ultrapassar
as preocupações terrenas, os interesses imediatos e atingir a Deus, o homem
deve viver o perdão e a paz. No entanto, se deixar que suas “instâncias
econômicas” – como classifica Marx – ditem os rumos de sua vida, o homem caminhará
em direção oposta, para a guerra, a competitividade, a exclusão, o
individualismo, o desenvolvimento a qualquer preço, a destruição da própria
nave cósmica que o acolheu dadivosa há apenas 50 mil anos (homo sapiens),
o que é bem pouco tempo para tanta destruição, se considerarmos que a vida
surgiu no planeta há 2 ou 3 bilhões de anos e a
própria Terra teria se formado há 5 ou 6 bilhões de anos, com o Sistema
Solar, como revela a ciência.12
Embora a manifestação franciscana
seja a mais lembrada, há outros exemplos, na Igreja, em que santos e ascetas
contemplaram a face do Criador na criatura: “Os animais e os seres do reino
mineral Vos louvam pela boca daqueles que o consideram” [aqui no sentido latino
de refletir, meditar, ponderar] afirma Santo Agostinho (354-430). Filho de
Santa Mônica, quando jovem de 19 anos e irrequieto como Francisco, deixa
Cartago, ao norte da África, e vai para Roma estudar Direito e ensinar
Retórica, no séc. IV, travando enorme
batalha entre permanecer com os
amigos maniqueístas13
ou
consagrar-se totalmente a Deus, como fará depois dos 30 anos, com a ajuda do
sábio bispo de Milão, Santo Ambrósio.
Em sua dúvida existencial, no
âmago do processo de conversão, Agostinho sentir-se-á impactado pela
expressividade da natureza. Seu louvor às criaturas, como em Francisco, é a
manifestação de seu louvor a Deus, inspirado no salmo 143: Os dragões da
terra e todos os abismos, o fogo, o granizo, a neve, a geada, o vento das
tempestades que executam as Vossas ordens; os montes e todas as colinas; as
árvores frutíferas e todos os cedros; os
répteis e as aves que voam; os
reis da terra e todos os povos; os príncipes e todos os juízes da terra; os jovens
e as donzelas, os velhos e os mais novos louvam o Vosso nome”. (SANTO
AGOSTINHO, Confissões, 1988, p. 156).
Para continuar, com bom êxito,
esta reflexão, devemos nos lembrar que a filosofia medieval ostenta duas
ramificações fundamentais: a patrística e a escolástica. A
primeira inicia-se no período decadente do Império Romano, no séc. III. Os
Padres da Igreja (Clemente de Alexandria, Orígenes, Tertuliano - principalmente
Santo Agostinho, figura principal da patrística, bispo de Hipona) tinham a
preocupação principal de relacionar fé e ciência, a natureza de Deus e da alma,
a vida moral. A escolástica é a especulação filosófico-teológica que se
desenvolve do séc. IX até o Renascimento. Tem este nome porque surgiu nas
escolas monacais fundadas por Carlos Magno no séc. VIII, origem das
universidades (de Paris,
Bolonha, Oxford etc) que, a
partir do séc. XI, passam a fecundar toda a Europa com a reflexão filosófica,
surgindo, então, no séc. XII, as traduções dos clássicos como Arquimedes, Hero
de Alexandria, Euclides, Aristóteles e Ptolomeu. Santo Tomás (1225-1274), na Suma
Teológica, recupera o texto original de Aristóteles que antes passava por
traduções árabes onde adquiria contornos panteístas. Com Aristóteles
cristianizado, surge a filosofia aristotélico-tomista, 14 que valoriza o conhecimento teórico em
detrimento das atividades práticas. É um contexto em que o modo de produção
feudal conduz ao desprezo pelo trabalho manual na gleba e à valorização do
nobre guerreiro que tem direito ao ócio com dignidade.
Do séc. XIV em diante a
escolástica vai cedendo lugar a posturas dogmáticas, contrárias à reflexão, que
desembocam no período negro do Santo Ofício, do index librorum prohibitorum ("lista
dos livros proibidos"), do Nihil obstat ("nada impede").
É a fase do magister dixit (“o mestre disse”) e ponto final. São deste
período os processos condenatórios - que levariam o papa João Paulo II a pedir
perdão à humanidade 500 anos depois - como a condenação de Galileu (1564-1642) que
se viu obrigado a abjurar o heliocentrismo para não ter o mesmo destino trágico
de Giordano Bruno, queimado vivo no séc. XVI por ter
defendido a infinitude do
universo e tê-lo concebido não como um sistema rígido de seres articulados em
uma ordem dada desde a eternidade (imutabilidade), mas como um sistema em permanente
transformação. 15
Esta leitura que fazemos, através
dos tempos, para identificar o contra-ponto filosófico entre homem/Deus,
natureza/Deus, ciência/fé não tem como escapar da abordagem religiosa, como se
vê, porque é no âmbito da filosofia religiosa que germinam os fundamentos da
própria ciência, vista como saber matemático por Descartes, como conhecimento
intuitivo por Espinosa (“da idéia adequada da essência de alguns atributos e
Deus, procede-se ao conhecimento adequado da ciência das coisas”),16 como “sistema”
por Kant (a unidade
sistemática) e por Fichte (a
unidade no todo). Talvez possamos concordar, a partir deste olhar, que os
movimentos atuais de protesto contra as agressões à natureza foram precedidos
de outros “gritos” que surgiram, também no Renascimento, quando a visão
antropocêntrica do mundo foi reafirmada através do questionamento do poder da
Igreja, reiterando-se a idéia de que o homem podia controlar tudo com as
próprias mãos.
Se o brado de Agostinho era uma
conscientização contra os riscos do maniqueísmo, se a crítica de Francisco,
apesar de eficiente, evitava o confronto direto com a ordem eclesial e com a
"Santa Igreja Romana" (expressão literal com que Francisco se referia
ao que hoje conhecemos como Vaticano)17, outros foram bem mais diretos e
veementes, já no contexto da reforma protestante18 que levaria a Igreja a rever posições.
Paradoxalmente foi um dos maiores nomes do humanismo renascentista, Erasmo de
Rotterdam (pseudônimo de Desiderius Erasmus:1469-1536), que elaborou uma das
grandes peças de acusação contra a
arrogância humanista de querer
saber tudo e tudo poder.
Padre Erasmo foi um ácido crítico
do poder eclesiástico e compartilhava as idéias humanistas do final do séc. XV.
Não se priva, contudo, de ridicularizar a aura divina de que os sábios,
filósofos e sacerdotes se revestiam através dos tempos. Em 1509, Erasmo vai à
Inglaterra e, convalescente de crises renais constantes, hospeda-se na casa de
Tomas Morus, outro nome cardeal do humanismo renascentista e que publicaria, em 1516, um dos documentos
referenciais da luta histórica pela liberdade: A Utopia. Na casa de
Tomas Morus, Erasmo redige o Elogio da Loucura, no qual ironiza de forma
demolidora para a época a aura divina auto-atribuída pelos sábios e filósofos.
Com séculos de antecedência, ele fulmina a ordem industrial-tecnológica:
"Digamos, pois, francamente, que a ciência e a indústria se introduziram
no mundo com todas as outras pestes da vida humana, tendo sido inventadas pelos
mesmos espíritos que deram origem a todos os males, isto é, pelos demônios,
que, por sinal, tiraram da ciência o seu nome". E mais: "[...]afirmo
que os que se aplicam ao estudo das ciências estão muito longe da felicidade e
são duplamente loucos, porque, esquecendo-se de sua condição natural e querendo
viver como outros tantos deuses, fazem à natureza, com suas máquinas de arte,
uma guerra de gigantes". (MARTINS, 1991, p. 46 - 47). 19
Essa desconfiança de Erasmo em
relação à ciência e ao racionalismo em geral, ajuda-nos na compreensão de que
nem só o homem é senhor de direitos na natureza. A própria natureza tem
direitos por si mesma, são os chamados “direitos intrínsecos”, algo que em
nossos dias alguns classificam como “loucura”,20 sem elogio, mas outros, tão
sábios quanto sensíveis às questões da nova era, chamam de “ecologia profunda”.
São pessoas que se debruçam sobre o entendimento da unidade sistêmica, da
unidade no todo, da
interdependência orgânica do
sistema único formado pelo binômio homem/natureza. A unidade estaria
consubstanciada já na concepção da própria Santíssima Trindade, o que nos permitiria
contemplar, ilosoficamente, a “face feminina” de Deus, neste mundo historicamente
machista, como estudamos em BOFF (1987:p. 283): A humanidade, como masculino e
feminino, foi criada à imagem e semelhança do Deus tri-uno. O
masculino e o feminino encontram
sua última razão de ser no mistério da comunhão trinitária. Embora a Trindade
seja transexual, podemos falar em forma masculina e feminina das divinas
pessoas. Assim podemos dizer Deus-Pai maternal e Deus-mãe paternal (BOFF, 1987,
p. 283).
A união profunda que leva todas
as coisas à correlação mútua, integrando inumeráveis sistemas abertos em
permanente interatividade, no cosmo e na terra, por todo o universo,
pré-existe, portanto, já no conceito de Criador e criatura. Agora podemos
examinar as relações das criaturas entre si.
2. Ecologia
Profunda
A crítica ao antropocentrismo
está presente em outros textos do séc. XVI, quando
já se advogava o direito
intrínseco dos animais e até mesmo de seres considerados inanimados
como as rochas, ilhas, florestas
etc, numa atitude legal (em alguns países) que já prefigurava a
base da chamada “ecologia
profunda” ou “ecologia radical”. Segundo tal conceito, como
entendido hoje, tratava-se de
demonstrar que se o homem continuar levando em conta apenas
os seus interesses, isto é, se a
sua relação com a natureza considerar as criaturas tão somente
em função do bem-estar do próprio
homem, logo os recursos irão se exaurir e o desequilíbrio
do sistema ameaçará a vida. Além
do manifesto franciscano nos primeiros séculos do segundo
milênio, outros documentos
anteriores à Revolução Industrial intuíam a necessidade de um
respeito profundo aos bens
naturais, de modo que fossem usados com bom senso, parcimônia
e critério, apenas para
manutenção da vida e não para causar morte e destruição. Desta forma,
a natureza tem direito à própria
vida e à intocabilidade a partir dela mesma, por sua
anterioridade histórica ao homem
sobre a face da Terra, por sua função vital de manter o
equilíbrio do sistema, por sua
destinação de assegurar a continuidade da vida ao fornecer os
insumos e recursos
consubstanciais à própria vida. Logo, seria apenas um ato de inteligência
humana respeitá-la. Mas não foi o
que ocorreu desde o Cântico ao Irmão Sol. Hoje, seria
algo estranho render louvores à
água fétida e negra do Rio Tietê – pelo menos no trecho da
capital – enaltecendo-a como
“irmã casta e pura”, embora ela continue sendo, mesmo poluída,
“preciosa e útil”. Mas se houve
um crime contra a natureza, não se pode culpar a água, que
antes da explosão imobiliária e
da chegada dos esgotos industriais era usada até mesmo para
campeonatos de remo ou passeios
turísticos. Do mesmo modo, quando uma chuva mais forte
inunda as avenidas marginais e as
baixadas, não temos o direito de nos aborrecermos com o
Tietê, pois o rio não transborda,
ele apenas volta para o seu leito natural formado pelas antigas
várzeas, agora transformadas em
cidade de pedra a partir de uma ótica que privilegia o lucro.
Pode-se dizer o mesmo a respeito
do direito dos cavalos e bois de não serem constrangidos
fisicamente para proporcionarem
lazer ao homem nos rodeios e na vaquejada; ou o direito que
têm os galos de briga a não se
auto destruírem nas rinhas para as apostas humanas; ou o
direito do ganso a não ser
alimentado à força para que seu fígado fique mais fluído e
proporcione um foie-gras mais
saboroso. E o caranguejo, siri, lagosta, que são cozidos vivos?
Afigura-se-nos “escandaloso”
pensar deste modo nestes tempos pós modernos.
Quando as associações protetoras
dos animais conseguem uma liminar para impedir um
rodeio, surgem acirradas
polêmicas na imprensa do interior do Brasil. Certamente era mais
“normal” tratar dos direitos
intrínsecos da natureza, como símbolo de respeito à vida, num
período da história humana em que
os bosques tinham alma, a natureza era um mistério, o
desconhecido estava encoberto
pelos véus do respeito místico e a imaginação das crianças era
embalada pelos contos de fadas,
duendes, a floresta de Robin Hood em Nottingham...a
sagrada luta em defesa dos
excluídos, dos pobres, do bem... Tudo isto foi rasgado e
racionalizado depois que o anjo
conversou com Descartes “ontem à noite”21 como sempre
lembra o professor Barco em suas
aulas na ECA/USP e nas palestras sobre educação
matemática por todo o país.
De qualquer forma, embora ainda
pareça uma pregação vazia, como foi, antes, a
luta que aboliu a escravidão no
Brasil, a ecologia profunda vai conquistando mentes e
corações. Um de seus eminentes
defensores é o professor Luc Ferry, doutor em filosofia e
ciências políticas da
Universidade de Caen-França. Ele publicou, em 1994, um brado de
alerta a favor de um outro olhar
sobre a questão ambiental, em seu livro “A Nova Ordem
Ecológica – A
Árvore, o Animal, o Homem”. 22 Em sua pesquisa, ele resgatou antigos
processos em que a natureza era
defendida por advogados especialmente nomeados pelo
Estado (na época o juiz
episcopal).
Cita, por exemplo, um processo de
1545, em que o juiz episcopal de Saint-Jeande-
Maurienne, na Savole, recusou-se
a excomungar uma colônia de carunchos que havia
invadido os vinhedos do lugar,
argumentando perante o advogado dos proprietários que os
animais, criados por Deus,
possuíam o mesmo direito que os homens de se alimentarem de
vegetais, limitando-se, por um
édito de 8 de maio de 1546, a prescrever numerosas preces
públicas e três dias consecutivos
de procissões em torno dos vinhedos invadidos para que os
insetos deixassem o lugar. Em
outros processos parecidos, foram providenciadas novas áreas
para acomodação de colônias de
cupins, não sem antes o juiz episcopal vistoriar a nova área
para verificar se era adequada
aos novos “inquilinos”. O autor cita ampla bibliografia a
respeito de costumes medievais em
que árvores e outros recursos naturais eram absolvidos ou
processados a partir de processos
legalmente instaurados.
A literatura específica também
registra exemplos mais recentes em que o meio
ambiente foi considerado sujeito
de direito, como ocorreu em 1970, na Califórnia, quando o
serviço de águas e florestas
concedeu às empresas Walt Disney uma licença para promover o
“desenvolvimento” de um vale
selvagem, o Mineral King, situado na Sierra Nevada. Na
ocasião, uma das mais eficazes
associações de ecologistas do mundo, o poderoso Sierra Club,
apresentou queixa, alegando que o
projeto – com investimentos de 35 milhões de dólares em
hotelaria e turismo – iria
destruir a estética e o equilíbrio natural do Mineral King. Como a
queixa foi rejeitada, o Sierra
Club solicitou a assessoria do professor Christopher Stone que,
em suas aulas na universidade,
defendia a tese da ecologia profunda. Como não existia
jurisprudência firmada sobre o
tratamento legal da natureza como sujeito de direito, Stone
redigiu, às pressas, um suporte
teórico para subsidiar a apreciação dos juízes, na forma de um
artigo publicado na seríssima Southem
California Law Review, propondo que “de maneira
profundamente
séria, sejam atribuídos direitos legais às florestas, aos oceanos, aos rios e a
todos esses
objetos a que se dá a qualificação de ´naturais´ no meio ambiente, inclusive ao
meio ambiente
inteiro”.
Resultado: Dos nove juizes, quatro votaram contra o argumento de
Stone, dois abstiveram-se, mas
três votaram a favor, de modo que as árvores perderam o
processo por apenas um voto.
Depois de narrar este fato, Luc
Ferry argumenta que “teria chegado a hora dos
direitos da
natureza, depois dos direitos das crianças, das mulheres, dos negros, dos
índios,
até mesmo dos
presos, dos loucos ou dos embriões [no âmbito da pesquisa médica, senão no
das legislações
sobre o aborto, células-tronco etc]. Em suma, trata-se de sugerir que o que
parecia
´impensável´ numa dada época, converteu-se hoje em evidência (FERRY, 1994,
p.15
- 16). 23
A problemática da ecologia
profunda também está presente na obra de Pièrre
Teilhard de Chardin (1881-1955),
paleontólogo, teólogo e pensador jesuíta francês que
escandalizou os conservadores
católicos ao observar que o universo tem vida inteligente e que
até as pedras têm algum tipo de
vida imanente, seguindo um finalismo que, em Hegel,
significa que o próprio mundo tem
sua razão de ser em sua finalidade última. Mas, enquanto
outras filosofias, como o
panteísmo, consideram a imanência divina na própria natureza,
negando, portanto, sua
transcendência – isto é, Deus estaria na natureza, não fora dela – a
Igreja busca conciliar os
princípios de imanência e transcendência,
recuperando o conceito de
enteléquia, em Aristóteles, pelo qual todos os entes, por serem
constituídos de matéria e forma,
tendem para um estado de perfeição (neguentropia)
específico de cada um, ou seja,
para um fim contido no próprio ente. Assim, Deus está
representado na natureza, mas a
natureza não é Deus, tal como a fotografia ou a imagem
representa mas não é a pessoa ou
objeto representado. Alberto Magno define claramente que
nem a natureza é Deus, nem a
relação entre Deus e a natureza é arbitrária. A razão de Deus
manifesta-se na ordem da
natureza, mas vai além dela. Na realidade, a criatura é mais do que
seu ser aparente. É uma questão
de saber ver, de epistéme theoretiké, no sentido de
competência (appartenance) do
olhar. Essa competência que Tomás de Aquino chama de
mirandum ao comentar a Metafísica,
de Aristóteles, é o que aproxima o filósofo do poeta
(LAUAND, 2002, p.137).24 A criação é um
convite à meditação. É meditando sobre as
criaturas que admiramos e
louvamos seu artífice. Divinorum factorum meditatio necessaria
est vai afirmar
Santo Tomás de Aquino, no livro II, cap. 2 da Contra Gentiles.
Para Chardin o universo caminha
para um ponto final de amadurecimento e
perfeita união com a realidade
divina. O surgimento do homem, sua socialização, a criação do
mundo da cultura seriam apenas
etapas de um plano maior onde o equilíbrio do sistema está
dado a priori, por isto
não pode ser rompido sob pena de destruir a própria vida. Neste
sentido, o princípio do
livre-arbítrio atribuído ao homem comporta a noção de que ele será
premiado ou punido pela natureza
conforme as suas ações. Desse modo a culpa pelas
enchentes ou as destruições
provocadas pelas variações climáticas deve ser buscada na
própria ação humana de passado
recente, conforme já vimos. Quando surgiu no planeta, o
homem já encontrou o universo em
perfeito funcionamento, com os planetas seguindo suas
órbitas regularmente, as estrelas
brilhando, o sol aquecendo para o germinar e a manutenção
da vida, as árvores dando frutos
e sementes, os elementos orgânicos evoluindo conforme cada
espécie...afinal, um sistema em
perfeito equilíbrio. Estudando a ecologia profunda – embora
às vezes criticada por um
radicalismo que, ao privilegiar as criaturas, acabaria excluindo o
próprio homem, no sentido
humanista do termo - será possível fazer o homem entender que
se alguém está colocando o
sistema em risco é ele mesmo, com sua cobiça e seu
individualismo.
O pensamento de Chardin incomodou
tanto a ortodoxia religiosa, por integrar os
resultados das ciências naturais
ao pensamento da Igreja, que ele viveu sob constante pressão e seus
escritos tinham de circular
mimeografados, sendo publicados somente após sua morte.
Modernamente, os conceitos de
integração entre homem, natureza e Deus, ou
entre ciência e religião, ciência
e fé, racionalidade e espiritualidade, objetividade e intuição
são bem mais aceitáveis, mesmo
entre renomados cientistas egrandes pensadores. Soren
Kierkegaard acha que
a fé supera a razão: ("Creio, ainda que [a existência de Deus] pareça um
absurdo") credo
quia absurdum! Com efeito, o homem ainda não conseguiu explicar
suficientemente a sua
origem, o propósito da vida e o que ocorre depois da morte. “A
humanidade é tão
limitada que não consegue compreender o início e o fim de sua existência”,
dirá o jovem Werther,
personagem de Goethe25 – defensor da natureza – no séc. XVIII. Para
Albert Einstein,
quando nos voltamos para o Universo, o que temos diante de nós é “o mundo
imenso,
que existe independente dos seres humanos e que se nos apresenta como um enorme
e
eterno enigma, [só] em parte acessível à nossa observação e ao nosso
pensamento”(EINSTEIN,
1982, p.15). 26 A infinitude do Universo ou a idéia de Deus não
eram um mistério
apenas para o pai da Teoria da Relatividade. Muitos outros já se
incomodaram com isto,
como nesta bela página de Santo Agostinho, baseada no salmo 99, em
sua busca da
espiritualidade:
Interroguei a terra,
o mar, os abismos e os répteis animados e vivos e responderam-me: “Não somos o
teu
Deus; busca-o acima
de nós. Perguntei aos ventos que sopram; e o ar, com os seus habitantes,
respondeume
[...]: “Eu não sou o
teu Deus”. Interroguei o céu, o sol, a lua, as estrelas e disseram-me: “Nós
também
não somos o Deus que
procuras”. Disse a todos os seres que me rodeiam [...]: “Já que não sois meu
Deus,
falai-me de meu Deus,
dizei-me ao menos alguma coisa d´Ele”. E exclamaram com alarido: “Foi Ele
quem nos criou”.
(SANTO AGOSTINHO, Confissões, 1988, Livro X - 6, p. 222 ). 27
O professor e físico
quântico indiano, Amit Goswami, da Universidade do
Oregon, observa que
todas as nossas ciências sociais, inclusive as descobertas de Eistein, são
baseadas na física
que Isaac Newton fundou no séc. XVII. O determinismo, a forte
objetividade e o
materialismo dela resultantes, são adequados quando investigamos a ordem
do mundo exterior,
mas não dão conta de explicar, ou, pelo menos, de tentar explicar, o que se
passa com um universo
muito mais próximo, o interior do próprio homem. Por isto, na década
de 1920,
a física clássica foi
substituída por uma nova física, denominada mecânica quântica, ou física
quântica.
[....] Algumas
décadas depois, essa nova física está provocando uma revisão crucial no modo
como nós
concebemos os
sistemas vivos e no modo como praticamos a biologia, a psicologia e, assim,
todas as
ciências sociais. No
novo paradigma, há uma janela aberta para a oportunidade, uma janela
visionária,
através da qual se
pode reconhecer que a consciência tem um papel decisivo na configuração da
realidade; a
espiritualidade pode, portanto, ser reconciliada com a ciência. (GOSWAMI, 2000,
p. 20). 28
Outro físico de
destaque, Fritjof Capra, Doutor em Física Teórica pela
Universidade de
Viena, situa esse confronto de idéias entre um antigo paradigma dominado
pela física,
lastreado no antropocentrismo (o homem é o centro), e um novo paradigma,
baseado nas chamadas
Ciências da Vida, filiadas ao ecocentrismo (a Terra é o centro). A
relação contemplada neste
novo paradigma não é uma relação hierárquica centrada no
verticalismo, onde
alguém domina alguém, alguém manda e alguém obedece. Trata-se de uma
relação de “rede”,
metáfora central da ecologia, como sistema, para significar a paridade, a
igualdade, a horizontalidade,
a responsabilidade comum pela preservação da vida, pois não há
como escapar se os
processos vitais se extinguirem. Vivemos, portanto, todos integrados em
uma ampla, mas única,
rede, a rede sistêmica da vida. Atentar contra qualquer ponto (ou nó,
ou nódulo) da rede é
atentar contra toda a rede. Todos são iguais diante do imperativo
categórico da
continuidade da vida, daí a noção de ecologia profunda, direitos intrínsecos da
natureza etc.
Trata-se de romper qualquer tipo de separatismo ou dualismo porque não há
duas ou dezenas de
redes separadas: há uma só rede que é a teia da vida. É como na Internet,
ou no hipertexto,
todos os pontos (ou links) estão conectados, mas nenhum é mais importante
que outro, todos têm
a mesma importância do ponto de vista da acessibilidade ao sistema
total. Já não temos
mais a relação de um para muitos, como na mídia tradicional, mas de todos
para todos, como
ensina Pièrre Levy. Ainda tomando a Internet como exemplo de integração,
podemos aduzir o
registro de M. Castells (2003, p. 287)29: “A
Internet é o coração de um
novo
paradigma sociotécnico que constitui, na realidade, a base material de nossas
vidas e
de
nossas formas de relação, de trabalho e de comunicação. O que a Internet faz é
processar
a
virtualidade e transformá-la em nossa realidade, constituindo a sociedade em
rede, que é a
sociedade
em que vivemos” .
Assim, contra o
antigo paradigma da crença no progresso material ilimitado, que
via no corpo humano
apenas uma máquina produtiva, surge, neste novo século, um novo
modo de ver o mundo,
que concebe o mundo como um todo integrado, holístico, ecológico. A
percepção ecológica
profunda reconhece a interdependência fundamental de todos os
fenômenos e nos
revela que, enquanto indivíduos e sociedades, estamos todos encaixados nos
processos cíclicos da
natureza, portanto somos dependentes desses processos. 30 Como
lembrava Einstein, a
natureza não precisa do homem, mas o homem precisa da natureza.
A literatura sobre
ecologia radical vem se ampliando a partir de Aldo Leopold,
falecido em 1948,
considerado o Pai da Ecologia Profunda, pois nos convida a derrubar os
paradigmas que
domimam as sociedades ocidentais em seu principal livro A Sand County
Almanac,
uma coletânea de ensaios publicada em 1949 e que contém o mais célebre entre
eles, A Land Ethic,
traduzido para o francês como L´éthique de la terre. Neste ensaio,
Leopold conclui que
assim como soubemos rejeitar a escravatura – que era uma instituição
plenamente aceita na
ética aristotélica, por exemplo, ou antes, na Odisséia, de Homero, em
que Ulisses, voltando
a Ítaca, não elimina apenas os pretendentes de Penélope, mas também
as escravas que a
eles se aliaram 31 – devemos, agora [lembremo-nos que o texto é de 1949],
dar um passo além,
levando finalmente a natureza a sério, considerando-a dotada de um valor
intrínseco,
como sujeito de direito. Trata-se, então, de desconstruir o “chauvinismo
humano” que
comporta o
preconceito antropocêntrico por excelência: aquele que nos leva a tomar o
universo por
teatro de nossas operações,
simples periferia de um centro instaurado em sujeito único de valor e de
direito. (FERRY,
1994, p.95 - 96). 32
A visão de Leopold
instalou amplo debate na ecologia norte-americana que tende,
hoje, via Alemanha,
principalmente, a introduzir-se na Europa. A questão central deste debate
é a seguinte:
trata-se, apenas, de cuidar dos nossos lugares de vida porque sua deterioração
ameaçaria nos atingir
ou, pelo contrário, de proteger a natureza como tal, porque descobrimos
que ela não é um
simples material bruto, mas um sistema harmonioso e frágil, mais
admirável em si mesmo
do que essa parcela ínfima, em suma, que nela
constitui a vida
humana?
O debate expõe, na
verdade, a existência de duas grandes correntes ecologistas no
séc. XX. A primeira é
reformista. Tenta controlar as poluições mais gritantes da água ou do
ar, modificar as
práticas agrícolas mais aberrantes nas nações industrializadas e preservar
algumas zonas
selvagens que ainda subsistem nelas, transformando-as em “reservas”. A outra
corrente concorda com
tais objetivos, mas é revolucionária: visa uma epistemologia, uma
metafísica e uma
cosmologia novas, assim como uma nova ética ambiental na relação
pessoa/planeta,
conforme a definição de um dos principais teóricos do fundamentalismo
ecológico, Bill
Duval. 33
O termo “ecologia
profunda” (deep ecology) foi utilizado no início da década de
70 pelo filósofo
norueguês Arne Naess para esclarecer esse debate originado em Leopold,
significando, hoje,
um movimento mundial que está na raiz do ativismo radical de entidades
como o Greenpeace,
o Earth first, o Sierra Club, alguns Partidos Verdes
(principalmente na
França e na
Alemanha), além de filósofos populares como Hans Jonas ou Michel Serres. A
escola de Naess34 faz
uma distinção entre “ecologia rasa” e “ecologia profunda”. A primeira é
antropocêntrica, o
homem está acima da natureza, é fonte de todos os valores. Ele atribui à
natureza um valor de
uso. A natureza é objeto a ser consumido. Esta é a corrente que levou o
princípio da
“dominação bíblica” ao pé da letra e que nem de longe aceitaria o protesto
ecológico de um
Francisco de Assis cultuando a água como “irmã”. Do ponto de vista das
nações, trata-se do
desenvolvimento a qualquer preço. Mesmo algumas empresas que poluem,
praticam essa
“ecologia rasa” na tentativa de “clarear” o seu produto junto à sociedade ou ao
mercado de consumo.
Trata-se de um termo que corresponderia, em Leopold, à corrente
“conservacionista” do
ambientalismo internacional. 35
A outra distinção de
Naess, para designar os que pregam uma mudança radical no
comportamento
ambiental, ainda a partir de Leopold, é a “ecologia profunda”. Ela vê o
mundo não como uma
coleção de objetos isolados, mas como uma rede de fenômenos que
estão
fundamentalmente interconectados e são interdependentes. Ela reconhece o valor
intrínseco de todos
os seres vivos e concebe os seres humanos apenas como um fio particular
na teia da vida.
Portanto, a natureza é sujeito da vida, não objeto. É ela que alimenta o
homem, e não o
contrário. Ela sustenta a vida, regulando o equilíbrio do sistema onde o
homem é apenas um ser
dependente.
A grande questão que
se coloca, entretanto, é como convencer o homem a abrir
mão de sua visão
antropocêntrica de mundo. Cabe indagar, até mesmo, se não haveria um
certo exagero anti-humanista
nas concepções da ecologia profunda. Não podemos,
naturalmente,
inverter as polaridades caindo no erro oposto de considerar o homem como
objeto da natureza.
Trata-se, então, de corrigir os excessos, de sustar a depredação, de
recuperar o que foi
danificado, de vivenciar um comportamento ambientalmente correto, de
dar cada um a sua
participação, por menor que seja, na certeza de que participar – ainda que
seja separando o lixo
reciclável no cantinho da cozinha – é colocar um tijolinho a mais no
esforço universal
para limpar o planeta.
No que se refere às
grandes corporações, onde o lucro é o motor de todas as
iniciativas, somente
o revigoramento da ética seria capaz de alterar os procedimentos. Mesmo
entre as pessoas,
como acabar com a chamada "Lei de Gerson" – que nos leva a tentar
obter
vantagens em tudo,
tentando tirar proveito das posições de superioridade que eventualmente
ocupamos na vida em
relação aos nossos semelhantes, como fazíamos no período da
escravidão – se não
internalizarmos uma consciência ética em nosso comportamento?
Quem nos ensinará a
ser éticos? Será a escola, a família, a religião? Mas a escola
está sucateada, a
família se divorciou e a religião transformou-se num supermercado de
fórmulas prontas e
comércio de ilusões através da proliferação das seitas com seus sacos e
malas de
dinheiro...Que esperança temos de retomar os clássicos como no Renascimento?
Onde Agostinho,
Tomás, Francisco, Erasmo, Chardin? Onde encontraremos debates sérios
sobre as questões que
dizem respeito à sobrevivência do homem neste planeta?
Se a resposta é
difícil, não é menos verdade que o estudo da ética (e da estética) se
impõe, mais do que
nunca.
3.
Ecologia e Ética
Quais os elementos
que podem induzir ao comportamento ético?
Aqui há dois caminhos
a seguir e ambos se complementam. O primeiro é a
educação – não só no
ambiente escolar convencional, mas ao nível da cidadania, com apoio
da mídia. O segundo é
a advertência – através de uma legislação firme, coerente, pertinente,
aplicável, funcional.
Quando somos penalizados no bolso, então compreendemos que é
preciso repensar o
consumo de energia, água, embalagens não recicláveis, combustíveis
fósseis, madeiras de
florestas não controladas ou quando queimamos, desmatamos, poluímos,
“assassinamos” animais
e árvores.
Não temos outro
caminho que não a retomada e o entranhamento da ética em
nossas vidas, desde
as atitudes mais simples que superam o “penso, logo existo” norma da
ecologia rasa, de
origem cartesiana e racionalista, para um “escolho, logo existo” – onde a
participação
responsável de cada um pressupõe níveis aprofundados de consciência,
característica da
ecologia profunda e do pensamento sistêmico. Mas, do que trata a ética?
O misticismo
neoplatônico colocou como propósito da conduta humana o retorno
do homem ao seu
princípio criador e sua integração com ele. Segundo Plotino, esse retorno é
o objetivo da viagem
do homem, é o afastamento de todas as coisas exteriores, é a fuga do
homem para a Unidade
divina. Afinal, “não temos aqui morada permanente”, vai dizer Santo
Agostinho, é preciso
buscar a Cidade Eterna e Verdadeira. É este conceito de ética que
domina todo o período
medieval. Santo Tomás de Aquino filia-se a Aristóteles para definir
que “a felicidade é o
fim da conduta humana, dedutível da natureza racional do homem”. Esta
visão já está
presente em Platão, que, na República, vai consagrar a justiça como
princípio da
ética. Do mesmo modo,
Hegel considera que o Estado é a “totalidade ética”, é o ápice da
“eticidade”, é a
moralidade que ganha corpo e substância nas instituições históricas que a
garantem. Como o
Estado é garantido pelo direito, a ética é filosofia do direito, enquanto a
moralidade é a
intenção ou a vontade subjetiva de realizar o que se acha realizado no Estado.
Recuperando o mito de
Prometeu – condenado por Zeus a ter o fígado reiteradamente
devorado pelas aves
de rapina por ter roubado o fogo do Olimpo para os homens e de ter-lhes
ensinado coisas úteis
à sobrevivência – Protágoras dirá, em 322aC, que o respeito mútuo e a
justiça são as
condições para a sobrevivência do homem. O que move a conduta humana é a
vontade de
sobreviver, é o apego à vida. Mas não há vida fora do direito e da moral. Para
sobreviver, o homem
deve conformar-se às regras e não pode agir de outro modo. Em
Epicuro, o que move a
conduta humana é o prazer e a dor, um ardentemente buscado, outro
ferrenhamente
evitado, dentro do possível: “Prazer e dor são as duas afeições que se
encontram em todo
animal, uma favorável, outra contrária, através das quais se julga o que se
deve escolher e o que
se deve evitar”, diz. (ABBAGNANO, 2000, p. 380). 36
A filosofia
epicurista foi evitada na Idade Média, mas foi retomada no
Renascimento quando
Lorenzzo Valla foi o primeiro a reapresentá-la em De voluptate
afirmando que o
prazer é o único fim da atividade humana e que a virtude consiste em
escolher o prazer e
evitar a dor. Em Hobbes temos que a maior aspiração humana é a autoconservação.
Ela é o fundamento da
moral e do direito: “A natureza proveu a que todos
desejem o próprio
bem, mas para que possam ser capazes disso, é necessário que desejem a
vida, a saúde e a
maior segurança possível dessas coisas para o futuro. De todos os males,
porém, o primeiro é a
morte, especialmente se acompanhada de sofrimento”.
(ABBAGNANO, 2000, p.
384) 37
O pensamento de
Hobbes – para quem o homem é lobo do próprio homem -
acaba incorporando
uma justificativa para comportamentos nem sempre éticos ao defender
que o fim justifica
os meios, o que vem a legitimar o poder do Estado e o próprio
individualismo
capitalista, pedra de toque da ecologia rasa.
Nietzsche, filiado à
linhagem intelectual de Darwin e Bismarck, influenciado pelo
pessimismo de
Schopenhauer e por seu amigo Wagner, considera que Bom é aquilo que sai
vencedor (“dizeis
que a boa causa santifica até a guerra? Eu vos digo: a boa guerra santifica
qualquer
causa”, dirá por Zaratrusta). Mau é aquilo que cede e falha. Trata-se
de uma ética
calcada em Spencer,
na qual a força é a virtude máxima e a fraqueza é o único defeito na luta
pela sobrevivência.
Ao criticar a covardia vitoriana dos darwinistas ingleses – só preocupados
com os negócios e os
lucros, herança genética que transmitiriam ao atual Império do Norte – e
a respeitabilidade
burguesa dos positivistas franceses e dos socialistas alemães, Nietzsche dirá
que “esses homens
tiveram a coragem de rejeitar a teologia cristã, mas não ousaram ser
lógicos
e rejeitar também as idéias morais, o respeito à humildade, mansidão e
altruísmo que
crescera
com essa teologia” (DURANT, 1983, p.10). 38
Espinosa viu na
tendência do homem a buscar tudo que lhe seja útil a ação da
Substância divina: A
razão nada exige contra a natureza, mas exige por si mesma, acima de
tudo, que cada um ame
a si mesmo, que deseje tudo o que conduz o homem à perfeição e que
cada um se esforce
para conservar o próprio ser, fazendo aquilo que julga melhor para si (Cf.
SCRUTON, 2000, p.
43).39 Adotar a alegria e evitar a tristeza, como fundamento da moral, é
a proposta de
Leibniz.
Mas, a partir do séc.
XVIII, o conceito de ético superou a questão do bem
individual para ser
visto como “a maior felicidade possível do maior número possível de
homens”, conforme a
avaliação de Hutchinson, numa fórmula depois adotada por Beccaria e
por Bentham. Foi Hume
que encontrou a palavra que exprimia a nova tendência: o
fundamento da moral é
a utilidade, mas uma utilidade social, coletiva. É boa a ação que
proporciona
felicidade e satisfação à sociedade. O homem está inclinado a promover a
felicidade dos seus
semelhantes. O sentimento de humanidade, ou seja, a tendência a ter
prazer com a
felicidade do próximo, é o fundamento da moral, o móvel fundamental da
conduta humana. Mais
tarde Adam Smith chamará de simpatia esse sentimento do espectador
imparcial que olha e
julga a sua conduta e a dos outros.
Em Kant há uma visão
mais absolutista do problema. Não se trata de emoção, mas
de razão. A razão não
pode ser medida apenas pela adequação dos meios aos fins, mas
depende do julgamento
dos fins. Assim, a moral é um fim em si mesma. Não está a serviço de
nenhum outro
objetivo. Não se deve agir moralmente para ser respeitado ou para ganhar o
céu, mas,
simplesmente, porque é moral. Esta é a razão prática, é um imperativo
categórico. A
norma de Kant é: “Age
moralmente!”. (K. & HÖSLE, 2001, p. 59). 40
Estudiosos e
filósofos diretamente ligados à questão ambiental também defendem
o pressuposto ético
como único capaz de mover o comportamento humano para um estágio
superior de
relacionamento com o meio natural e com o próprio homem. Assim, o
economista-humanista
polonês, naturalizado francês, Ignacy Sacs, que morou 14 anos no
Brasil, professor da
Escola de Altos Estudos de Ciências Sociais, em Paris, ao difundir o
conceito de
“ecodesenvolvimento”, como consultor do Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente
(PNUMA), afirma que “o princípio ético subjacente é o da solidariedade
com
as gerações futuras”, mas adverte que “a solidariedade
diacrônica não pode separar-se
do
seu princípio gêmeo de solidariedade sincrônica com os nossos contemporâneos”
(SACHS, 1986, p. 49).41 Ele
cita BENNETT (1976, p. 311) para explicar que “a
preocupação
ecológica não deveria dissociar-se da preocupação com a equidade social entre
as
nações e dentro delas... sobretudo porque o uso que o homem faz da natureza
está
inextricavelmente
entrelaçado com o uso do homem pelo homem”. Percebemos, aqui, a
presença inequívoca
dos fundamentos éticos vistos anteriormente, voltados para o bem
coletivo, para a
satisfação social, através da solidariedade. Temos uma condensação preciosa
de tudo isto em Hume
quando ele atribuiu utilidade prática à moral e à ética através do
“prazer
de ser solidário”, de tal modo que a ética estaria centrada no respeito, no amor ao
próximo. Se recuamos,
então, ao séc. III de Agostinho, nesta análise, porque não recuar de
uma vez ao princípio
da Nova História e relembrar na própria origem: “Que vos ameis uns
aos
outros como eu vos amei”? 42 Afinal,
como separar ciência e fé quando o objeto de estudo
é a vida? O amor e a
ética não se conciliam com a “ecologia rasa”. Não seria ético, por
exemplo, o programa
de crescimento zero resultante do encontro de empresários no chamado
Clube de Roma, em
1968, quando os males da humanidade foram atribuídos à explosão
demográfica dos
países pobres. Pelo contrário, para Sachs (1986, id. ibid.) é necessário
desenvolver
aceleradamente e sustentavelmente os países do terceiro mundo como précondição
sine
qua non para a diminuição das taxas demográficas no futuro.
Conforme este ponto
de vista, não são as populações pobres que desequilibram o
meio ambiente, é o
modo como a renda é distribuída, situação perversa que está na raiz do
comportamento não
ético entre países e classes sociais. Mas é a dependência cultural – muitas
vezes capitaneada
pela mídia – que leva ao mal desenvolvimento dos países do terceiro
mundo, devido à
insistência em tentar imitar o modo de vida dos países ricos onde economias
mais fortes têm mais
condições de absorver o excesso de consumo – naturalmente com
inevitáveis problemas
para o meio ambiente por sua conformação sistêmica. Nos países
pobres o “crescimento
imitativo” leva a mais empobrecimento porque, ditado artificialmente
pela moda, é
insustentável. Aqui surge a necessidade de educar para o consumo sustentável
em conformidade com
as disponibilidades regionais. É um espaço que se abre para a
valorização da
cultura e dos costumes nacionais, opondo-se o local ao global, como defendem
vários pensadores,
entre eles BARBERO (1987), ORTIZ (1994) e o próprio professor Ignacy
Sachs.
A pobreza nos países
latino-americanos, por exemplo, não resultou de um padrão
ético de
comportamento. Pelo contrário, ela resulta do mito do desenvolvimento ilimitado
que
tende a concentrar a
renda sempre mais. Não se pode considerar ético que 6% da população
mundial – residentes
nos EUA - consumam 30% a 35% de todos os recursos da Terra.
Segundo MOSER (1984,
p. 55),43 citando levantamentos da ONU, só na década de 1959 a
1968 os Estados
Unidos consumiram mais recursos do que o mundo inteiro desde sua origem.
Um norte-americano
consome 16 vezes mais energia que um chinês; 53 vezes mais que um
indu; 109 vezes mais
que um habitante do Sri Lanka; 438 vezes mais que um malásio e 1.072
vezes mais que um
morador do Nepal. Enquanto isto, 10% de toda a renda mundial
concentram-se nas
mãos de pouco mais da metade dos 6 bilhões de habitantes do planeta,
exatamente 60%.
Da mesma forma não se
pode considerar que existem ética e solidariedade
humana em um contexto
sócio-planetário onde o déficit habitacional dos países pobres é de
150 milhões. Só na
Ásia mais de 100 milhões de pessoas vivem em habitações precárias. Na
América Latina faltam
mais de 20 milhões de moradias. Ao mesmo tempo, um tanque custa
US$ 1 milhão (ou 100
mil toneladas de arroz, ou 1.000 salas de aula para 30 mil crianças); um
bombardeiro custa US$
20 milhões (ou 40 mil pequenas farmácias). E quantas crianças
morrem de fome, todos
os dias?
O desequilíbrio do
ecossistema mundial provocado pela falta de ética e de
estética, levou o
Papa João Paulo II a se manifestar assim na carta Dives in Misericordia:
Sucede em nossos dias
que, ao lado daqueles que são abastados e vivem na abundância, há centenas de
milhões que vivem na
indigência, padecem a miséria e, muitas vezes, morrem de fome. É por isto que a
inquietude moral está
destinada a tornar-se ainda mais profunda. Evidentemente, na base da economia
contemporânea e da
civilização materialista, há uma falha fundamental, um mecanismo defeituoso,
que
não permite à família
humana sair de situações tão radicalmente injustas. (Osservatore
Romano. 7 dez.
1981. n. 11, p. 12). 44
A noção de que o
problema do equilíbrio mundial é, basicamente, uma questão
ética foi a razão do
surgimento de teologias de contestação, na década de 1970, propondo uma
Igreja mais presente
e mais atuante nos problemas humanos, como se deu com a Teologia da
Libertação – do
peruano Gutierrez e do brasileiro Leonardo Boff – pregando a opção
preferencial pelos
pobres. Reunidos em Puebla, os bispos latino-americanos já afirmavam em
1979: “Vemos, à
luz da fé, como um escândalo e uma contradição com o ser cristão, a brecha
crescente
entre ricos e pobres. O luxo de poucos é um insulto para a miséria das grandes
massas”.
45
Professor de Ética e
Teologia Moral, na Pós-Graduação da PUC-Rio, Antonio
Moser aborda a ética
como ciência categoricamente normativa dos atos humanos, à luz da
razão natural. Ela (a
ética) não apenas descreve comportamentos humanos mas traça
imperativos para que
o homem possa realizar-se na sua humanidade. É através da vida
humana ameaçada na
terra que a ecologia e a ética encontram-se diante de um mesmo e
gigantesco desafio: o
que fazer para possibilitar a continuidade da vida sobre o planeta?
Para dar conta do
desafio à sua frente, a ética deixa o eternismo platônico (mundo
das idéias) para
situar-se, hoje, no plano das preocupações terrenas (mundo real). Segundo
Moser, a ética
desloca-se do antigo conceito de “permanente” (esse) para o conceito
hegeliano
de evolução na
continuidade (fieri). Agora ela é constituída na e pela história.
Por isto assume
traços de
“provisoriedade”. (MOSER,1984, p. 31 - 32). 46
As atualizações (aggiornamento)
promovidas pela Igreja através do Concilio
Vaticano II revelam
essa preocupação com a ética do fieri, voltada para o bem coletivo,
desautorizando a
ética do individualismo cartesiano que apresenta o homem embevecido com
a própria
inteligência, como se pode verificar nesta declaração conciliar.
Cumprem-se cada vez
melhor os deveres da justiça e caridade se cada um, contribuindo para o bem
comum segundo suas
capacidades e as necessidades dos outros, promover e ajudar também as
instituições
públicas e
particulares que estão a serviço de um aprimoramento das condições de vida dos
homens...que
todos considerem como
sagrada obrigação enumerar as relações sociais entre os principais deveres do
homem de hoje.
(Documento do Concílio Vaticano II, cit. por MOSER. 1984, p. 33). 47
O professor Moser, à
luz da ética, propõe uma nova sociedade com um programa
de quatro pontos: 1.
Abandono da civilização do desperdício; 2. Mais justa distribuição dos
recursos humanos; 3.
Atenção central à produção de alimentos; 4. Ação global contra a
miséria e a fome.
Ele avalia que “só
uma ação global, com a integração de esforços das
organizações e dos
governos, de boa vontade, que não isole os problemas da miséria e da
fome, será capaz de
tornar o panorama mundial menos sombrio para um futuro próximo”. E
conclui: Quem deve
ir para o banco dos réus é o desperdício dos ricos, não as migalhas que
alimentam
milhões de miseráveis.
A abordagem ética do
relacionamento humano é, portanto, presença marcante,
tanto na hagiologia –
desde a patrística e a escolástica, como vimos nesta modesta diacronia –
como também na
filosofia clássica. Igualmente podemos considerar que a partir da
Revolução Industrial
a desconfiguração do belo natural acentuou-se porque a natureza passou
a ter um valor de uso
no processo de produção voltado para a acumulação. A proposta de um
mundo feliz para
todos, presente no Iluminismo, só se realizou para poucos, exatamente
através do processo
de acumulação capitalista, como efeito de uma visão reducionista de
mundo na qual o
individualismo assumiu proporções de imperativo categórico, exatamente ao
contrário do
prefigurado na ética kantiana. Não será difícil, então, constatar que a utopia
do
mundo eticamente
solidário ficou mesmo no campo da utopia, o que não deve tirar o ânimo
dos que ainda apostam
na possibilidade de um outro mundo. É certo que em muitos outros
períodos da história
humana, cada qual segundo as suas características, o conceito de belo e
estético sofreu
transformações.
À luz da modernidade,
a Santa Inquisição não seria santa. Confrontada com
Gisele Bünchen, a
Mona Lisa não seria bela. O desprezo aos trabalhadores braçais e
artesãos
– próprio do
Feudalismo – não seria estético. A violação da propriedade pela
imposição do
mais forte, na
ausência do Direito, não tinha nada de belo. Por isto não se pode,
racionalmente,
comparar as épocas, porque cada época deve ser comparada com ela mesma.
Hoje temos águas
poluídas pelo esgoto urbano ou pelo derramamento de petróleo. Mas
ninguém mais corre o
risco de receber o conteúdo de um penico esvaziado na cabeça ao
passar sob uma
janela, mesmo de famílias nobres. Nem mesmo o Rei Sol contava com a
comodidade de um vazo
sanitário instalado em qualquer favela do mundo civilizado. Os
bastidores da
literatura inglesa dão conta que diante da casa do pai de Shakespeare, no
interior
da Inglaterra, havia
permanentemente um cheiro horrível por causa de uma montanha de
estrume bem em frente
da janela. Então podemos dizer que o fenômeno da urbanização – com
o saneamento, por
exemplo - trouxe a solução de todos os problemas? Que hoje vivemos a
estética do mundo em
sua plenitude? Por certo que não.
Se concluímos, desta
forma, que é indispensável a retomada ética para conduzir o
homem a um mundo mais
feliz, também somos levados a este modo de ver diante do
resultado nada
estético que a vida moderna nos apresenta. Com efeito, considerando a estética
como sinônimo do belo
harmônico já estudado nos antigos gregos – portanto da Verdade e do
Bem - não temos qualquer
condição de avaliar como belo o desencontro do mundo moderno
nos seus mais
diferentes aspectos, seja o social, o econômico, o cultural ou qualquer outro.
Igualmente deveríamos
perseguir um ideal ético e estético para o próprio jornalismo dentro
do sistema
constituído pelos meios de comunicação. Chegaremos lá.
No meio ambiente, a
falha estética é ainda mais gritante, pois se a “irmã água” de
Francisco já não é
casta e já começa a escassear, se ela é a “presença de Deus na terra”,
conforme o louvor
agostiniano, e se Deus é a própria estética do equilíbrio neguentrópico, da
perfeição, da
harmonia das partes, em Tomás de Aquino, o homem moderno terá muita
dificuldade para
perceber a mesma extesia dos santos diante da natureza poluída. Que tipo de
emoção estética nos
conduzirá ao logos divino – conforme o pensamento aristotélico-tomista
– se temos diante de
nós a natureza desgrenhada, violentada e semi-destruída ou, do ponto de
vista da ecologia
humana, um ser humano desesperançado, estressado, humilhado e confuso
neste período de tão
evidente mal-estar da civilização, como entrevisto por Freud? 48 Que
mundo é este em que a
alma se questiona sobre o sentido da vida quando a infra-estrutura da
própria vida, que é a
natureza, está atacada de morte? Onde está o Belo que nos conduz à
reflexão interior, ao
mundo das idéias, à contemplação de Deus nas criaturas? Qual a
avaliação estética do
nosso mundo? Haveria estética na guerra, na corrupção?
Porque é importante
refletir sobre a estética, após analisarmos a questão ética?
4.
Abordagem Estética
De início é preciso
reconhecer que não se pode conceber a estética como valor
absoluto, acima da
moral, por exemplo. Conceber um modo estético de ser, no
relacionamento
social, nas práticas profissionais, no trato com a natureza, na concepção do
texto ou da própria
arte não pode ser uma obsessão, um fim em si mesmo, que nos faria
relegar a segundo
plano outros compromissos como a ética, o respeito, a amizade, o amor
etc visto que isto
nos levaria a uma vida artificial, vazia e hipócrita, como nessa ditadura da
moda atual que leva
as top-models à autodesnutrição consciente – com riscos para a saúde –
para permanecerem
“dentro do padrão”. De igual modo o estetismo de Don Juan, o sedutor,
leva a uma vida
mesquinhamente tediosa. Sob este aspecto, é impossível concordar com
Oscar Wilde para quem
a arte é mais importante que a própria vida, pois não existe arte sem
vida e é a vida que
dá sentido à arte e a tudo o mais. Também Soren Kierkegaard critica o
estetismo consumista
de quem vive no instante, apenas para colher rosas, sem os espinhos,
praticando um
oportunismo que menospreza a solidariedade e o verdadeiro amor ao próximo
(desinteressado e
puro), o que, não raro, acaba levando ao desespero. (ABBAGNANO,
2000, p.
375). 49
O ideal estético,
identificado aqui como a norma do gosto, em Hume (1711-
1776) vincula as
noções de arte e de belo como objetos de uma única investigação,
superando a separação
encontrada nos antigos gregos onde Aristóteles considera a arte
enquanto poética (que
consiste na ordem, na simetria), enquanto Platão estuda o belo,
separadamente, como a
manifestação evidente das idéias, isto é, dos valores. Entretanto, se só
a arte é bela, fruto
da inteligência e da inventividade, como considerar bela a natureza que não
é arte criada pelo
homem? A conexão entre belo artístico e belo natural desenvolveu-se a
partir do séc. XVIII,
com a já citada norma de Hume e, principalmente, em Kant, para quem
“a natureza é bela quando
tem a aparência de arte” e “a arte só pode ser chamada de bela
quando nós, conquanto
conscientes de que é arte, a consideramos como natureza”. Em
qualquer das
definições, tanto do ponto de vista do observador, como por parte do artista
que
cria (mesmo quando
imita o modelo ou a natureza), está implícita a imanência do
transcendente, isto
é, a inspiração espiritual, o traço divino que explica a manifestação do
gênio e a emoção
estética do espectador. Para Hegel, a obra de arte não está na tela, na
madeira ou na pedra;
no caso da poesia ou do texto, não está nas letras e nas palavras...ela está
dada antes, está no
espírito criador que ilumina e inspira. Assim, todos vêem o bloco de
pedra, só
Michelangelo vê o Moisés, porque a inspiração é única. Muitos jornalistas
cobrem
uma entrevista
coletiva, mas só uns poucos captam detalhes que renderão outras pautas até
mais significativas
ou que vão dar um toque especial na reportagem. O mesmo vale para o
trabalho de apuração,
de investigação. Como dizer que jornalismo não é arte? Como ser
jornalista sem
conhecer história da arte, sem ter noção de belo estético, belo moral ou sem
estudar filosofia?
Em sua rotina de
trabalho, o jornalista bem formado sabe que também fora da
crítica da arte e da
própria especulação filosófica, o domínio da estética é cada vez mais
utilizado para o
debate de problemas de ordem psicológica, política, moral, social etc. Por
dever de ofício, eles
igualmente sabem que, no parlamento brasileiro, quando um deputado ou
senador é cassado por
“falta de decoro parlamentar” não significa, propriamente, que ele
transitou nos salões
do Congresso com a braguilha aberta ou algo assim (em outro contexto o
presidente Bill
Clinton acabou absolvido), mas que infringiu a ética (a moral dos costumes) e
a estética (do
políticamente correto), portanto seu crime é de corrupção por frustrar a
expectativa da
sociedade que o nomeou seu representante. O Belo comportamento não se
realizou. No caso dos
presidentes essa falta de estética dá margem ao impeachment ou à
nãoreeleição
(às vezes).
Para Nietzsche, é
indispensável à arte a perfeição do ser e das atitudes, o
encaminhamento do ser
para a plenitude, a divinização da existência, é o estado apolíneo que
resulta da embriaguez
dionisíaca.50 Para Hegel a tarefa da arte é superar a própria arte
conduzindo o homem
para o transcendente, o espiritual, isto é, para a religião e a filosofia,
pensamento parecido
com o de Benedetto Croce, para quem “a arte é conhecimento”, como
em Aristóteles. Só
pela educação chegamos ao conhecimento, então a arte tem uma função
educativa. Adorno não
considerava o surrealismo de André Breton (1924) 51 –
que
contaminara seu
companheiro na Escola de Frankfurt, Walter Benjamin - como arte por
não ver nele um
propósito dialético.52 Sob este aspecto, a arte está a serviço da doutrinação
política, como
queriam os partidários do realismo ou da arte concreta, nos países comunistas.
Assim, em Lukács a
arte é “reflexo da realidade”, é “expressão da autoconsciência da
humanidade em dado
momento histórico”. Este pensamento leva ao pé da letra a
manifestação de Marx
em 1843: “ Então se verá que o mundo possui desde há muito tempo o
sonho
de uma coisa, e bastará adquirir consciência para que a possua realmente” 53.
Por isto
o movimento de André
Breton pregava a reconciliação do sonho com a realidade em um tipo
de realidade
absoluta, ou surrealidade. Tratava-se de transformar a realidade de
acordo com
os desejos humanos.
O jornalista atento
percebe, assim, que cobrir uma mostra cultural ou uma sessão
do Congresso não é
muito diferente, quando podemos perceber a estética da arte e a ética (ou
falta de) do
comportamento humano, analisando o seu conjunto e as suas implicações.
A aplicação do
paradigma estético para analisar, por exemplo, a criatividade
humana, é bem clara
em filósofos mais recentes e nossos contemporâneos como o bem
humorado sociólogo
italiano Domenico De Masi (1999), freqüentador do excelente programa
Roda Vida, comandado
por Paulo Markun na TV Cultura. Profeta do saboroso “ócio
criativo”, Domenico
conduziu uma pesquisa, nos anos 1980, sobre a sociedade pós-industrial,
narrando a história
de 13 grupos europeus que se revelaram altamente criativos entre 1850 e
1950.54 Defensor
do senso estético como parâmetro para o valor das coisas, o professor titular
de sociologia do
trabalho da Universidade de Roma La Sapienza, mostra, na conclusão desse
trabalho, que a
criatividade, no mundo da produção, é filha dileta de um equilíbrio delicado
entre razão e emoção,
entre fantasia e senso prático. Para ele, essa equação é a mola
propulsora do
progresso do mundo globalizado no que se refere à produção, à criação artística
e ao bem-estar.
Assim, não basta ser criativo, é preciso espírito empreendedor e paixão
motivadora. Ele
compara que no passado, exatamente há cinco séculos, Michelangelo
Buonarroti precisou
ser capaz de controlar milhares de operários, durante vários anos, para
construir a
monumental cúpula da basílica de São Pedro, em Roma, enquanto hoje, no
mundo pós-industrial,
não basta a genialidade isolada de alguns para condicionar
movimentos históricos
como foi o Renascimento. É necessário o trabalho em equipes
preparadas e
motivadas que determinam a sorte dos empreendimentos mais notáveis. Mas isto
não exclui a “faísca
de luz” que vem do traço genial do líder, do condutor do grupo, no qual o
grupo acredita e com
o qual interage.
No jornalismo, o
trabalho em equipe – onde a inteligência emocional conta tanto
quanto o preparo
racional – é a estrutura básica na qual se apoia todo o processo de criação
intelectual e de
produção industrial presentes nos modernos meios de comunicação de massa.
Naturalmente cumpre
às boas escolas de jornalismo dotarem os estudantes destas noções
relacionadas com a
capacidade de conviver com o diferente, de aceitar o outro, de ser
solidário e bom
caráter para que o trabalho em grupo obtenha os melhores resultados. Na
própria escola o
sentido de equipe deve ser despertado e valorizado na produção acadêmica.
Em uma de suas
entrevistas ao Roda Viva, anos atrás, De Masi contou que em determinada
época de sua carreira
acadêmica exigia que os alunos, ao entregarem seus trabalhos de grau,
comprovassem o
esforço de alfabetização de certo número de italianos. Propôs essa idéia
para o Brasil, certamente
por não compreender como a universidade brasileira preza tanto a
burocracia que tudo
trava e tudo impede. Certamente a estética da cultura nacional ou da
educação brasileira
seria outra, com providências tão simples. Isto evitaria o vexame do
Tribunal Superior
Eleitoral ter que exigir dos candidatos a vereador, em algumas regiões, a
prova de que sabem
escrever o próprio nome.
5.
Conclusão
Neste artigo fizemos
um breve levantamento sobre a relação dos homens com a
natureza, onde
emergem os conceitos filosóficos a respeito da existência de Deus e sobre o
sentido da vida.
Depois discutimos o conceito de “ecologia profunda”, puxando o debate para
o plano do próprio
homem onde a preservação da natureza deve ser praticada em função dela
mesma e não do homem
em si, ficando implícito, do mesmo modo, que a nossa aceitação do
outro – do seu modo
de vida, de ser, de pensar, de se relacionar com o seu Deus, com a sua
sexualidade, a sua
etnia, o seu corpo etc – deve se dar a partir do outro mesmo e não a partir
de mim, dos meus
parâmetros, da minha aceitação ou não. (“Discordo inteiramente do que
dizeis,
mas defendo até a morte vosso direito de expressá-lo”, pontificava
Voltaire). O
encaminhamento
natural para adquirirmos esse respeito pelo outro – animal, árvore, pedra ou
gente – seria a
revalorização da ética, disciplina tão desprezada, exatamente nestes tempos
nos quais faz tanta
falta, que em muitos cursos de jornalismo é uma matéria que vale apenas a
metade das demais,
contando, portanto, com apenas dois créditos na grade universitária, o
que significa apenas
duas horas de aulas por semana e não quatro como as outras. Sem ética a
sociedade não vai a
lugar nenhum. Só teremos a corrupção que resulta da já citada "Lei de
Gerson". O
resultado da corrupção é mais corrupção, mais violência, mais desemprego, mais
injustiça social,
porque é preciso pagar mais impostos para cobrir as despesas do governo e
das empresas com as
vultosas propinas, o que encarece o custo-Brasil para os investidores
externos. Através da
ética, poderemos aspirar a um comportamento estético nas artes, na
sociedade, na
cultura, na educação e até na política. Poderemos pensar um “jornalismo
estético” não do
ponto de vista da apresentação física dos meios, mas do ponto de vista do seu
comprometimento
social com a comunidade, da sua capacidade de servir ao receptor e não de
servir-se dele para
obter outras vantagens. Trata-se de colocar o receptor como sujeito e não
como objeto da
informação.
Sob tal ponto de
vista, podemos nos filiar à abordagem de Hans Robert Jauss que
trata exatamente de
elevar o receptor da informação ao status de sujeito, mas um sujeito que
determina o próprio
contexto de produção do discurso. Isto talvez explique porque os grandes
meios de comunicação
contam sempre, em sua estratégia operacional, com um braço forte que
o grande público não
percebe, chamado Instituto de Pesquisa. Além das pesquisas de
aplicação externa
sobre assuntos de interesse político ou econômico ou social, tais institutos
também pesquisam a
aceitação do próprio veículo, a ponto de alguns apresentadores de TV,
tempos atrás, tocarem
um sino toda vez que o Índice Verificador de Audiência, mantido pelo
IBOPE, batia o
concorrente...o que pode ser considerado a própria estetização da informação,
isto é, a informação
(muitas vezes gritada, como em certos programas de TV, ou
desonestamente
adulterada, como em alguns programas vespertinos, no estilo fofoca) pela
informação, apenas
voltada para o faturamento da audiência que resultará em “faturamento”
da nova tabela de
anúncios...Um fim em si mesmo.
Foi com uma aula
inaugural na Universidade de Constança, na Alemanha, em 13 de
abril de 1967, que
Jauss lançou a sua Teoria Estética da Recepção, com o texto “A História da
Literatura como
provocação à Teoria Literária”. Para ele, “a obra literária não é um objeto
que
exista por si só, oferecendo a cada observador em cada época o mesmo
aspecto...ela é
um
processo de recepção e produção estética que se realiza na atualização dos
textos
literários
por parte do leitor que os recebe, do escritor, que se faz novamente produtor,
e do
crítico,
que sobre eles reflete” (JAUSS, 1994, p. 25). 55
Certamente, só pela
educação ampla, integrando escola e sociedade, com a
estratégica
utilização dos meios de comunicação, e através de uma legislação que cumpra sua
obrigação de coibir
os crimes ambientais, de forma enérgica e justa, será possível caminhar
para o mundo estético
também em relação ao meio ambiente e não só na Literatura como
visto em Jauss.
Se tivermos uma
formação ética para consumir sem afrontar a justiça social e os
direitos do outro,
por exemplo, se formos educados a consumir sem consumir o meio
ambiente, se
chegarmos a um acordo sobre a “estética do consumo” no mundo pós-industrial,
então poderemos
propor uma estratégia de educação integrada e permanente para a
sustentabilidade do
outro mundo possível.
NOTAS
1 O
último grande filósofo da Natureza foi Demócrito (460 - 370 a C), natural da
cidade portuária de Abdera, na
costa norte do mar
Egeu. Achava que todas as coisas eram constituídas por partículas minúsculas
chamadas
átomos. Mas seriam
indivisíveis e diferentes para, combinados, gerarem a transformação. Era uma
Teoria
Atômica
semi-perfeita. Hoje a ciência mostra que os átomos podem ser divididos em
partículas ainda menores,
ou elementares:
prótons, nêutrons e elétrons.. Mas a ciência acha que deve haver um limite para
tal divisão. Cf.
GAARDEER,1995, p. 57.
2 "A
Terra é paisagem, é fala, é mensagem que podemos escutar. A Terra também somos
nós mesmos, os seres humanos [...] O valor supremo é preservar este planeta - e
só temos este - porque ele está profundamente ameaçado e não temos uma Arca de
Noé que salve alguns desta vez e deixe perder os outros. Esta é a base para qualquer
outro valor. O segundo valor é preservar a família humana, a espécie humana,
junto às demais espécies, e garantir as condições para que ela subsista e
continue a desabrochar, a desenvolver-se. São os dois valores supremos de uma
ética planetária, terrenal." Cf. entrevista de Leonardo Boff à Revista Caros
Amigos. São Paulo, set. 1998.
3 A
era glacial mais estudada foi a que ocorreu no período Quaternário e se
estendeu por boa parte do Pleistoceno – quando as geleiras chegaram a cobrir
cerca de um terço da superfície terrestre - encerrando-se há cerca de 10.000
anos, já no Holoceno, conforme estudamos na Geografia.
4 Cf.
BOFF, L. Revista Caros Amigos, São Paulo, set. 1998.
5 "Se
considerarmos o tempo decorrido desde a data em que avaliamos o aparecimento do
homem (entre 100.000 e 50.000 mil anos atrás ) de 2 a 5% desse tempo são
ocupados pelo Homo sapiens e de 0,2 a 0,5% pela evolução histórica. Ora,
só podemos nos assustar com a criatividade e a destruição que se verificaram
nesse breve período" Cf. MORIN, 1975 p. 192.
6 "Todos
nós brasileiros, somos carne da carne daqueles pretos e índios supliciados.
Todos nós, brasileiros, somos, por igual, a mão possessa que os supliciou. A
doçura mais terna e a crueldade mais atroz aqui se conjugaram para fazer de nós
a gente sentida e sofrida que somos e a gente insensível e brutal, que também fomos.
Descendentes de escravos e de senhores de escravos seremos sempre servos da
malignidade destilada e instalada em nós, tanto pelo sentimento da dor
intencionalmente produzida para doer mais, quanto pelo exercício da brutalidade
sobre homens, sobre mulheres, sobre crianças convertidas em pasto de nossa
fúria". Cf.
RIBEIRO, Darcy. O
Povo Brasileiro, 1995, p. 120.
7 Não
mais, Musa, não mais que a lira tenho destemperada e a voz enrouquecida, e não
do canto, mas de ver que venho cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais
se acende o engenho não o no-lo dá a pátria, não, que está metida no gosto da
cobiça e na rudeza de uma austera, apagada e vil tristeza CAMÕES. Os
Lusíadas. Canto X-145.
8 Só
no final de sua vida, Camões obteve uma “tença” (pensão) real para não morrer
de fome. Mas já estava tão endividado que morreu na miséria e foi enterrado
como indigente, em Lisboa, vitimado pela Grande Peste, em 1579. Não tinha
sequer um lençol para amortalhar o corpo.
9Alguns
estudiosos consideram que "o movimento ecológico no mundo teve início na
Idade Média, com a criação das forests - áreas de reserva natural que
deram origem às primeiras leis florestais. Com elas a coroa inglesa obrigava os
camponeses a proteger a fauna nativa e seu habitat ". Cf. artigo de
Naná Prado: O Meio, o Ambiente, a Paz. In: www.bonsventos.com.br
Acesso em: 19 out. 2005.
10 Citado
por STRABELI, 1993, p. 115.
11 Cf.
STRABELI, 1993, p. 19.
12 Universo
- 7 bilhões de anos Antropóides - 10 milhões de anos Terra - 5 bilhões de anos
Homínidas - 4 milhões de anos
Vida - 2 bilhões de
anos Homo Sapiens - 100.000 a 50.000 anos Vertebrados - 600 milhões de anos
Cidade Estado - 10.000 anos
Répteis - 300 milhões
de anos Filosofia - 2.500 anos Mamíferos - 200 milhões de anos Ciência do Homem
– 0
Cf. MORIN, 1975, p.
7.
13 A
Seita dos Abafadores, ou cátaros, que era comum no tempo de São Francisco, teve
origem em outro movimento bem anterior que sobreviveu até o séc. XIII. Era o
“maniqueísmo”, sistema religioso dualista fundado pelo sábio Mani, no séc. III,
segundo o qual o mundo é dominado por dois princípios antagônicos: o Bem e o
Mal, Deus e o Diabo. Era um amálgama de idéias orientais incluindo Budismo,
Cristianismo, Gnosticismo, Mitraísmo e, sobretudo, Zoroastrismo. Em sua
cosmogomia da salvação, o homem teria sido criado por Satã, mas trazia em si
partículas de luminosidade divina que tinham de ser liberadas. Isto explica
porque, ao se converter, Agostinho proclamará que o homem, feito por Deus à sua
imagem e semelhança, é “todo bem”.
14 Cf.
ARANHA & MARTINS, 1995, p. 143
15 Cf.
id. ibid., p. 146
16 Cf.
ABBAGNANO, 2000, p. 137
17 Nos
textos franciscanos nunca é nomeado o Vaticano pois é um epônimo
posterior ao Santo. São Francisco de Assis usava a expressão "O Senhor
Papa" ou "A Santa Igreja Romana"(Explicação pessoal de
Strabeli).
18 Para
Hegel, "é a Reforma e não o Renascimento que deve ser descrita como ´o sol
que a tudo ilumina´. A Reforma resultou da corrupção da Igreja, através do
comércio de indulgências plenárias (perdão dos pecados, salvação eterna), [numa
espécie de coisificação ou reificação do transcendente]. Cf. SINGER, 2003, p.
33.
19 MARTINS,
1991, p. 46 - 47
20 Além
de Erasmo, outros grandes nomes se ocuparam da loucura. Em 1880, ao escrever Aurora,
Nietzsche afirmou no parágrafo 14: " Através da loucura vieram os maiores
bens à Grécia ", disse Platão com toda a velha humanidade... Para todos
aqueles homens superiores que foram irresistívelmente impulsionados a quebrar o
jugo de toda convenção e fazer novas leis, não havia alternativa, se não
eram realmente loucos [grifo de Nietzsche], a não ser fazerem-se de loucos.
Cf. HAYMAN, R. NIETZSCH e suas vozes, 2000, p. 21 Conta-se
que Descartes começava com estas palavras suas descobertas sobre o Método e a
Matemática.
22 Cf.
FERRY, 1994, p. 12
23 id.
ibid., 1994, p. 15 e 16
24 LAUAND,
2002, p. 137
25 GOETHE,
Os Sofrimentos do Jovem Werther, 2002, p. 154.
26 EINSTEIN,
1982, p. 15
27 SANTO
AGOSTINHO, Confissões, 1988, Livro X-6, p. 222.
28 GOSWAMI,
2000, p. 20.
29 CASTELLS,
2003, Internet e Sociedade em Rede. Apud MORAES, 2003, Por uma outra
Comunicação, 2003, p. 287. 30 CAPRA, 1996, p. 25.
31 “Não
morram simples morte as que, nos braços de infames tais, enchiam-me de opróbio
e a minha casta mãe”, declara Telêmaco ao receber de seu pai, Ulisses, a ordem
para punir com a morte as escravas que se deitavam com os pretendentes de
Penélope, durante a viagem mítica do herói. (HOMERO, 2003, p. 387. Odisséia,
livro XXII, c. 340).
32 Cf.
FERRY, 1994, p. 95 - 96.
33 Citado
por FERRY, 1994, p. 96.
34 Citado
por CAPRA, 1996, p. 26.
35 O
professor Wilson Bueno, que ensina Jornalismo Científico na ECA/USP, tem
alertado para o uso que muitas empresas e entidades fazem das bandeiras
ambientalistas, mesmo quando seu negócio é apenas o próprio lucro, como no caso
do agronegócio ou de empresas altamente poluidoras e destruidoras da
paisagem ambiental. O professor, através da Internet, também denunciou, em
2004, uma tentativa feita pela Monsanto (multinacional que comercializa
sementes de soja transgênica) no sentido de financiar a produção de livros
didáticos dirigidos às crianças da escola pública [o que, naturalmente, poderia
dar margem para se amenizar os efeitos nocivos do consumo de alimentos
geneticamente modificados].
36Cf.
ABBAGNANO, 2000, p. 380
37 Op.
cit., 2000, p. 384
38 Cf.
DURANT, 1983, p. 10.
39 Cf.
SCRUTON, 2000, p. 43.
40 Cf.
K. & HÖSLE, 2001, p. 59.
41 Cf.
SACHS, 1986, p. 49.
42 Cf.
João 15, 12
43 Cf.
MOSER, 1984, p. 55
44 Cf. Osservatore
Romano. 7 dez. 1981. n.11, p. 12.
45Cf.
Bispos Latino-Americanos. “Evangelização no Presente e no Futuro da América
Latina-Puebla”.
Petrópolis, 1979,
cit. por MOSER, 1984, p. 29.
46 Cf.
MOSER,1984, p. 31 - 32.
47 Cf.
Documento do Concílio Vaticano II, cit. por MOSER. 1984, p. 33.
48 “A
questão fatídica para a espécie humana parece-me ser saber se, e até que ponto,
seu desenvolvimento cultural conseguirá dominar a perturbação de sua vida
comunal causada pelo instinto humano de agressão e autodestruição. Talvez, precisamente com
relação a isso, a época atual mereça um interesse especial. Os homens adquiriram
sobre as forças da natureza um tal controle, que, com sua ajuda, não teriam
dificuldade em se exterminarem uns aos outros, até o último homem. Sabem disso,
e é daí que provém grande parte de sua atual inquietação”. (FREUD, 1997, p. 111
- 112).
49 Cf.
ABBAGNANO, 2000, p. 375.
50 Cf.
ABBAGNANO, p. 372.
51 Aliás,
o surrealismo era incompatível com o realismo socialista que se tornou a linha
do Partido, por isto o apoio de Breton a Moscou não era recíproco. Alguns
surrealistas seguiram Louis Aragon que rompeu com Breton e se uniu ao Partido
Comunista em 1932. Breton foi ridicularizado em um congresso cultural em Moscou
em 1935. Se autodeclará trotskista e em 1936 purgou seu movimento de elementos
comunistas stalinistas.
(BUCK-MORSS, 1981, p.
254).
52 Quando
Adorno baseava sua filosofia marxista na experiência estética, seu objetivo não
era “estetizar” a filosofia ou a política, mas reconstituir a relação dialética
entre sujeito e objeto que acreditava ser a base estrutural correta de todas as
atividades humanas: conhecimento, praxis política e arte. Neste sentido, tanto
a filosofia como a arte teriam uma função moral-pedagógica, a serviço da
política e não como propaganda manipuladora, mas ensinando com o exemplo.
(BUCK-MORSS, 1981, p. 251).
53 Karl
Marx (1843), citado em George Lukács, Historia y consciência de clase,
p. 3. In BUCK-MORSS, 1981, p. 255.
54 Cf.
De MASI, A Emoção e a Regra, 1999.
55 Cf.
JAUSS, 1994, p. 25.
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Pedro
Celso Campos,57, defendeu sua tese de doutorado em 28.03.2006, na ECA-USP, sob
o título "Jornalismo Ambiental e Consumo
Sustentável - Proposta de Comunicação Integrada para a Educação
Permanente", 324p., sob orientação do Prof. Dr. Luiz Barco. Dessa tese foi
retirado o presente artigo. É jornalista profissional desde 1969, graduado pela
Universidade de Brasília, e há dez anos ensina "Produção Jornalística -
Técnicas de Reportagem e
Entrevista" e "Jornalismo Impresso III" na Faculdade de
Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista "Júlio
de Mesquita Filho" - UNESP, campus de Bauru. No mestrado estudou a comunicação
na Igreja Católica. Atualmente pesquisa a visibilidade do idoso na mídia.
E-mail:
pcampos@faac.unesp.br Home-page: www.pedrocampos.com.br
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