UM ESPAÇO PARA AS
CELEBRAÇÕES DA COMUNIDADE.
Ione Buyst.
“O Mestre pergunta: Onde está
a sala em que comerei a páscoa com meus discípulos?” (Lc.22,11)
Onde sua comunidade costuma reunir-se para celebrar
a liturgia? Se você tivesse que enumerar as coisas que não podem faltar no
lugar da celebração, o que você diria? É preciso uma Igreja para celebrar a
liturgia? Qual é o seu lugar preferido para o seu encontro com Deus? Por
que?... Eis algumas perguntas que poderão servir como introdução ao nosso tema,
quem sabe, conversando com algumas pessoas da comunidade. A pergunta também
pode ser formulada assim: A seu ver, parra que serve a Igreja? O que não pode
faltar nela?..
As
palavras-chaves que iremos trabalhar neste capítulo são: casa, templo, altar,
ambão (estante), cadeira da presidência.
1 – A
novidade: não temos templo.
A maioria das
tradições religiosas possui seus lugares sagrados para o encontro com o divino
e para o culto dedicado a ele. São árvores sagradas, fontes, rios, montanhas,
grutas, templos, pirâmides, tumbas... O povo da primeira aliança – se bem que
tem consciência de que o eterno não cabe em espaço definido – conhece lugares
sagrados onde se faz a experiência de Deus. Lembremos apenas alguns deles:
. Abraão
constrói um altar em Betel: Gn 12,6-9;
. Jacó tem um
sonho muito significativo, também no monte Horeb (que significa casa de Deus)
Gn 28,10-22.
. Moisés e
povo de Israel encontram Deus no monte Horeb, onde recebem as tábuas da lei e
celebram a aliança: Ex 3,1-22; 19, 1-25.
. Durante a caminhada
de quarenta anos no deserto, a ‘ Tenda da Reunião’ com o sto rsscitado ‘santo
dos santos’ e a ‘arca da aliança’ é o lugar da manifestação do Senhor e do
encontro com o seu povo: 33,7-1; 40,1-15.34-38.
Mais tarde, o templo em Jerusalém se torna ‘casa’ para o Senhor morar ( apesar da resistência
dos profetas): 2Sm 7,1-17; 1Rs8 (principalmente vs. 1-13 e 26-40).
Mas, no tempo
de Jesus, o templo de Jerusalém virou ‘uma casa de comércio’, na expressão de
Jesus em Jô 2,16. Então, um novo templo é anunciado: a humanidade de Jesus, seu
corpo ressuscitado será doravante o único ‘templo’, o lugar de encontro com
Deus. (Jô 2,18-22). “ Pois nele habita
corporalmente toda a plenitude da divindade”, como escreve Paulo aos
Colossenses (2,9) e é impossível restringi-lo a um espaço qualquer. A
comunidade dos cristãos, a Igreja, como ‘corpo de Cristo’ no Espírito Santo, é
também ela ‘templo espiritual’ onde se oferecem ‘ sacrifícios espirituais’,
onde se adora Deus em Espírito e verdade (Cf. Ef 2,19-22; 1Pe 2
4-10; Jô 4
23). Por isso
os cristãos eram considerados ‘ateus’, porque não tinham templo, nem
sacrifícios ‘de verdade’ nem altares como os outros povos. É no encontro dos
irmãos e das irmãs que o Ressuscitado se faz presente, estejam reunidos onde
estiverem; a presença dele não está condicionada a um espaço físico.
No entanto, os cristãos necessitam
de um lugar par se encontrar em assembléia para ler as sagradas escrituras e
celebrar a eucaristia em memória do Cristo ressuscitado.
2- Um lugar de reunião para a comunidade
No inicio, reunia-se nas
casas (At 2, 42-47; 20,7-12), como Jesus havia feito na sua última ceia, antes
de sua morte, no cenáculo, no primeiro andar de uma casa (Lc 22, 7-13). Na época da perseguição pelo Império Romano,
os cristãos celebravam escondidos nas catacumbas; Os túmulos dos mártires
serviam de altar. Depois de longo período de perseguições, o Imperador romano
Constantino, concedeu a liberdade religiosa, em 313, e ofereceu as basílicas
para as reuniões do numero crescente de cristãos. As basílicas eram espaços
públicos para reuniões, para o comercio e para as sessões do judiciário; Foram
adaptados para as reuniões litúrgicas e dedicadas ao culto. Era forte a
referencia aos mártires. E, assim, volta à idéia de um templo, no lugar da casa
da comunidade.
Em cada época da história, o
tipo de construção revela a maneira de ser e de pensar da Igreja. Na Idade
Media, as catedrais Góticas criam um presbitério maior, com amplo espaço para o
coro dos monges que asseguram o oficio divino; Em lugar do Cristo Ressuscitado,
é o Crucificado que ocupa o centro da liturgia; O povo já não tem mais
participação ativa e busca as criptas onde se encontram as relíquias dos
mártires. Na época da Contra-Reforma, a Igreja Católica quer se afirma contra
as Igrejas Protestantes; Então, suas Igrejas se caracterizam pelo pomposo
estilo barroco e o centro é, não mais o altar, mas o tabernáculo, insistindo
nba presença real de Jesus Cristo na hóstia sagrada. No inicio deste século,
surgem Igrejas neo-romanas e neo-góticas; representam como um refugiar-se no
passado, por não conseguir se situar no mundo industrial. As Igrejas modernas,
buscando acompanhar os ventos democráticos, querem funcionalidade e pretendem
facilitar a participação.
A renovação conciliar
situa-se nesta última corrente. Promovem ainda uma volta as fontes,
restabelecendo a centralidade de Cristo Ressuscitado e do altar; o tabernáculo
vai, de preferência, para uma capela à parte. O povo de Deus é de novo
considerado como sujeito da liturgia e se agrupa em circulo ao redor do altar.
A Igreja volta a ser casa da comunidade, para o encontro com Cristo
Ressuscitado e para, com Ele, passar da morte para a vida. Igrejas antigas são
adaptadas às novas exigências teológico-litúrgica, preservando, no entanto, seu
valor histórico-artístico. Insistisse na funcionalidade, mas também no
simbolismo que deve traduzir o mistério. Entendesse que tudo é simbólico, desde
a forma da construção e os matérias utilizados, até as peças mais importantes
como altar, ambão, a cadeira da presidência, ou ainda o círio pascal e as
imagens, por exemplo.
No
Brasil, pós-Vaticano II, o surgimento das comunidades de base provoca a
descentralização e multiplicação dos locais de celebração principalmente nas
periferias das grandes cidades. O povo se reúne e celebra em casas, em
barracos, debaixo de árvores, pontes, lonas de circo, em praças publicas, no
alpendre de uma casa... Na medida em que
a comunidade se estabiliza e organiza, busca construir uma capela ou
Igreja; deseja um lugar fixo, estável, bonito. Por tudo o que vimos, é
importante, a comunidade discutir o projeto e colocar-se de acordo sobre o que
se quer e porque. A Igreja de pedra deve ser como que um retrato, quem expressa
a cara da comunidade, de sua fé e de sua cultura. Serve tanto para confirmar em
sua identidade os que dela participam, como que para mostrar esta identidade
aos de fora. A Igreja-construção é para ser sinal de Deus e de seu reino no
contexto social e cultural, onde a comunidade está inserida; é para ser sinal
da comunhão em Jesus Cristo Ressuscitado e no Espírito Santo que dá a vida,
sinal da nova humanidade que queremos ser, na fraternidade, na solidariedade,
na justiça e na paz...
E
é bom lembrar ainda que a Igreja de pedra, assim como a Igreja-gente é
provisória; aponta para o futuro, para a assembléia definitiva de todos os
povos na casa do Pai. Nenhuma construção deve impedir a Igreja de caminhar, de
ser missionária, de andar pelos caminhos da história. Pois não temos aqui
morada definitiva e somos discípulos e discípulas do Filho do homem que não
tinha onde encostar a cabeça (cf Mt 8, 20). Os munerosos santuários antigos e
novos, nos lembram essa nossa condição de romeiros, de peregrinos.
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